É assim que os cearenses chamam a cidade de Cid Gomes, o ex-escoteiro socialista que implantou no sertão uma amostra do american way of life
Leonardo Coutinho, de Sobral
Fotos Manoel Marques |
Paris e Nova York Sob inspiração francesa, Sobral ergueu seu arco do triunfo. Agora, usa ônibus escolares americanos e incentiva a prática do beisebol |
Encravada no sertão cearense, a cidade de Sobral cultiva estrangeirices com tal entusiasmo que passou a ser conhecida no resto do estado pelo título desta reportagem: "The United States of Sobral". Lá, circulam ônibus escolares americanos (originais), que, além de serem amarelos como os que se veem nos filmes, ainda trazem a inscrição em inglês: School Bus. Lá, pratica-se beisebol – ou uma versão rudimentar do jogo, segundo a confederação brasileira desse esporte. Lá, o Kentucky Derby, uma das mais tradicionais competições do circuito do turfe dos Estados Unidos, inspirou a criação do Derby Club Sobralense. A diferença é que, sob o sol do agreste, os jóqueis treinam com calção de futebol. Lá, a população apelidou o parque da cidade de "Central Park", parodiando seu congênere nova-iorquino. A veia, digamos, cosmopolita de Sobral não é nova, mas ganhou força entre 1997 e 2004, quando a cidade foi administrada por Cid Gomes, do PSB, o atual governador do Ceará. Desde então, já há quem veja semelhanças entre o Rio Acaraú, que corta a cidade, e o Hudson, que banha Nova York.
Antes de Gomes, a cidade mimetizava europeísmos, por obra e graça (muita graça) de um bispo que mandou e desmandou naquelas bandas durante a primeira metade do século XX: dom José Tupynambá da Frota. Ele queria conferir a Sobral um ar francês e, entre outros lampejos geniais, teve a ideia de homenagear Nossa Senhora de Fátima com um monumento inspirado no Arco do Triunfo, erguido em Paris por Napoleão Bonaparte, para comemorar suas vitórias militares. O monumento está localizado na Avenida Boulevard do Arco. Como tem bares e restaurantes, os sobralenses fazem uma associação imediata. "Ela lembra a Champs-Elysées de Paris", diz o colunista social Arnaud Cavalcante. Sob o domínio do socialista Cid Gomes, Sobral passou a se espelhar nos Estados Unidos. Ele começou a imaginar a aparência globalizada de Sobral em 1996, ainda na condição de deputado estadual. Escalado pela assembleia cearense para a árdua tarefa de fazer um périplo pelas câmaras legislativas americanas, Cid voltou dos Estados Unidos cheio de projetos. No ano seguinte, ao assumir a prefeitura, passou a pô-los em prática.
Seu irmão mais velho, Ciro Gomes, ajudou-o a dar os primeiros passos na americanização de Sobral. Em 1998, Ciro, que frequentou um curso de inglês básico na Universidade Harvard, convenceu uma fundação a doar 36 school buses usados para a prefeitura do irmão. O município precisou arcar somente com o frete dos veículos. Pena que houve um inconveniente: no Ceará, não existem peças nem mecânicos especializados para esse tipo de ônibus. Por isso, eles foram sendo encostados à medida que precisavam de manutenção. Dos 36 ônibus, só três ainda estão em circulação. Numa boa iniciativa, inspirada pelo empenho acadêmico do irmão mais velho, o então prefeito Cid resolveu que daria proficiência em inglês aos alunos das escolas públicas. Para tanto, instalou o Palácio de Ciências e Línguas Estrangeiras em um casarão neoclássico onde funcionou aquele que foi o clube mais elegante da cidade, o Palace. Construiu também um museu em memória da missão de cientistas ingleses que foi a Sobral em 1919, para tentar comprovar a teoria da relatividade por meio da observação de um eclipse. Hoje, o prédio abriga um relativamente bom observatório astronômico.
Sob a influência de Cid, a cidade foi adotando costumes de climas temperados. A 27 quilômetros do centro, a Serra da Meruoca, um maciço rochoso de 920 metros de altura, sofisticou-se. Em casas com lareira, os ricos aproveitam temperaturas que dizem ser 15 graus mais baixas do que a média de Sobral (30 graus), para usar seus casacos elegantes – um deles, como não poderia deixar de ser, é Cid. Nos restaurantes da Meruoca, saboreiam-se fondues, sopas e chocolate quente. E um festival de inverno oferece atividades culturais aos turistas. É a Aspen do Ceará.
Fotos Manoel Marques |
Paisagem globalizada |
No fim de sua gestão como prefeito, Cid patrocinou três equipes de beisebol e prometeu construir um campo exclusivo para a prática do esporte nas margens do Acaraú – que jamais saiu do papel. "Mas, quando ele era prefeito, nós tinhamos prioridade para usar o campo de futebol", pondera Reinaldo Marques Filho, treinador de todos os times de beisebol locais. Marques Filho é amigo de Cid desde a infância, quando eles viviam sempre alertas como escoteiros.
Esses rasgos modernizadores garantiram a Cid uma enorme popularidade. Muitos sobralenses o chamam de "El Cid" e o identificam como o redentor de uma profecia feita pelo bispo Tupynambá da Frota, o do arco do triunfo. Ao morrer, em 1959, ele previu três décadas de estagnação para Sobral – estancada pelo socialista yankee. Hoje, boa parte do maior reduto eleitoral do ex-prefeito e atual governador ainda é abastecida por carros-pipa, não fornece água tratada a toda a população nem dispõe de saneamento. Em Sobral, as principais causas de morte são as doenças infecciosas e parasitárias. Mas as ruas são iluminadas e a polícia se desloca, no confortável estilo "Miami Vice", em carrões equipados com ar-condicionado e câmbio automático. Graças à Votorantim e à Grendene, que empregam 12% da população, o comércio local é vigoroso. Cid agora quer mais um retoque à sua Nova York: metrô. No início do mês, lançou uma licitação para começar as obras. Em Fortaleza, a capital, cuja população é catorze vezes a de Sobral, o metrô local ainda não transportou ninguém. Está sendo construído desde 1999. Very good, Cid.
Fonte: Revistas » Edição 2132 / 30 de setembro de 2009
continuação... concordo no que diz respeito a entrada de conceitos estadunidense em nossa cultura, devemos sim reforçar os traços culturais brasileiros; contudo o texto é uma critica politica piega, não tinha desculpa melhor para atacar o governo. Um efeito[o da entrada de culturas extrangeiras] visto em todo o país, de diferças formas diferentes deve ser tratado não como algo particular... Devemos preservar sim nossa cultura! Jogo político piega!
ResponderExcluirTambém concordo que temos que valorizar e ressaltar os nossos traços culturais... Mas vamos imaginar Sobral sem essas 'modernizaçoes' estrangeiras... Seria mais um alvo de piada pra os anti - nordestinos!!! Não sei o porquê desse ataque aos politícos locais... Tudo bem em falar da possivel perca da "brasilidade" por parte dos moradores da cidade, mas por quê esse ataque político?
ResponderExcluirA reportagem também critica a falta de atençao à diversas áreas...agora imagine se junto a elas somassemos falta de lazer e infraestrutura?