Bruno Peron
Somos espectadores do desentendimento que há entre educadores e educandos no Brasil. Gestores e legisladores, alguns dos quais sugeriram “revoluções” na maneira de educar, propuseram medidas improcedentes e polêmicas para a educação. Entretanto eles poucas vezes desceram da frente do púlpito para sentir a necessidade de quem está atrás de uma escrivaninha.
Estou preocupado com a aprovação de mais uma lei que reproduz a educação, mas não a transforma. A lei 13.006 prevê que, a partir de 26 de junho de 2014, as escolas tupinicas devem exibir pelo menos duas horas mensais de filmes tupinicas a estudantes no ensino básico. É um artigo acrescido à lei de dezembro de 1996 que determina as bases da educação nacional, e que aponta que a exibição de filmes nacionais constituirá “componente curricular complementar integrado à proposta pedagógica da escola” (http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/_Ato2011-2014/2014/Lei/L13006.htm). Mas esta lei não muda nem revoluciona os conteúdos educativos. Muito melhor seria se esta proposta de obrigatoriedade de horas mensais de exibição de filmes tupinicas tivesse efeito nas salas de cinema em todo o Brasil. Refiro-me à norte-americanização dos espectadores com produtos culturais de Hollywood. Não deveria ser nas escolas.
Alguns problemas ficam pendentes com a aprovação da lei 13.006. O principal é que o Maquinário tupinica incha sem que seus gestores e legisladores saibam bem o que fazer para conquistar o desenvolvimento tão esperado. Além disso, o cinema tupinica teria mais uma forma de financiamento público (e de promoção, diga-se de passagem), juntamente com os incentivos da Lei do Audiovisual e os projetos da Agência Nacional do Cinema (ANCINE).
Igualmente, é preciso alertar que nem toda escola tupinica tem estrutura para exibição de filmes. Em muitas delas, haverá um televisor pequeno encima da mesa do professor, enquanto a turma do fundo evade de uma vez qualquer possibilidade de cultivar gosto pela arte. Ainda, há dúvida sobre qual será o critério de seleção dos filmes e sobre quem os escolherá: um longa-metragem que mostre a malandragem nas cidades e um curta-metragem sobre o sucesso da Copa para completar duas horas de exibição obrigatória. Tudo sob medida para cumprir rigores da lei.
Em nenhum momento, questionou-se a dificuldade de representar a arte apenas através do cinema, já que ela envolve um leque muito mais amplo de beleza e criatividade. Logo, não estou certo de que o cinema obrigatório seja auspicioso para estimular o gosto pela arte em termos de desenho, pintura, cerâmica, dança, música, teatro, e outras de suas formas. É oportuno colocar aqui que o gosto pela arte e pela cultura estimula-se com invenção e não com imposição.
Acrescento a meu raciocínio que a educação básica se oferece num momento fundamental de formação do caráter e do cidadão. A flexibilidade de jovens é maior durante esta fase. Contudo, a educação continua irradiando-se de cima (o que o professor e, pior ainda, o Maquinário acham que o estudante deve aprender) em vez de estimular a aprendizagem que emana de baixo (de que o estudante precisa para desenvolver seu gosto por arte, cultura e ciência).
É surpreendente que a lei que institui tamanha obrigatoriedade seja de autoria do senador Cristóvam Buarque, para quem a arte é basilar no processo educativo. Se este for um dos projetos para a “revolução” na educação que ele tanto defendeu durante suas campanhas eleitorais e seus discursos no Senado, queimaremos o filme. É importante que as crianças e os adolescentes se deslumbrem com as “coisas belas”, como bem apregoou o senador Buarque. Mas quem somos nós para determinar o que é belo e o que é feio, o que é útil e o que é descartável?
Deixemos que os jovens descubram o mundo sem imposição.
Assim esperamos que eles reescrevam o Brasil com invenção.
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