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domingo, 15 de junho de 2014

Achamos que não é conosco

 

Bruno Peron

Algumas bocas sinceras dizem que um dos motivos pelos quais Estados Unidos não ratificou o Protocolo de Quioto (que prescreve metas de redução de gases que prejudicam o meio ambiente) é o receio de entravar alguns setores de sua economia. Talvez se refiram às indústrias estadunidenses que poluem o ar, a água e o solo. Por analogia, é possível deduzir que o Brasil só não acaba com o desmatamento de uma vez por causa da expansão descontrolada da agricultura e da pecuária no interior.

No entanto, a Organização das Nações Unidas (ONU) declarou recentemente que tais setores agrícolas e pecuários no Brasil encontraram maneiras de prosperar sem desmatar. Este ritmo de sustentabilidade une-se ao elogio da ONU, durante uma reunião sobre mudanças climáticas em 5 de junho de 2014, aos esforços do Brasil no combate ao desmatamento e na redução da emissão de gases que causam efeito estufa.

O Brasil é um caso emblemático para a ONU devido à extensão territorial colossal da Amazônia e do papel “emergente” que algumas lideranças brasileiras creem que o país tem nas relações internacionais. A ONU comparou o caso do Brasil com os de países africanos, asiáticos e sul-americanos.

É verdade que algumas situações de desmatamento se devem a mudanças climáticas que prolongam o período de secas. No Brasil, porém, está claro que nosso desmatamento tem origem num modelo de desenvolvimento econômico corrosivo e predador. Sustentabilidade é uma roupa nova que esconde um corpo sujo. Desse modo, os que mais falam de sustentabilidade são os que menos fazem para conquistá-la.

O pronunciamento da ONU de que a intensidade do desmatamento tem diminuído no Brasil é alentador, mas digo que o cenário ambiental ainda é preocupantemente grave neste país. Matas extensas transformam-se em glebas para agricultura e pastos para pecuária. Mas não num passe de mágica. Logo, a diminuição do ritmo de desmatamento não é um convite à comemoração porque árvores continuam sendo derrubadas.

Não há dúvida de que duas medidas governamentais têm tido efeitos positivos: demarcação de terras de proteção ambiental e punição a empresas que desmatam para explorar tais áreas. As advertências, leis e medidas do governo fortalecem-se, mas dependem também do consentimento de empreendedores e neo-bandeirantes.

É necessário que os brasileiros nos desenvolvamos com todo respeito à natureza e ao próximo. E não é só porque a ONU se pronunciou ou pela mensagem de outro organismo internacional que o Brasil segue nos Twits do desenvolvimento. Basta observar que mais tiramos que repomos, poucas cidades brasileiras têm planos de reciclagem de lixo, e nossas metrópoles expandem-se com pouca arborização.

Temos assim santuários florestais virgens, de um lado, e zonas urbanas sedentas de expansão descontrolada, de outro. O encontro entre estas duas entidades (a natural e a humana), cedo ou tarde, ocorre através de uma sustentabilidade fraudulenta.

Por fim, aproveito para finalizar este artigo recordando ao leitor que o Brasil se impõe metas ambiciosas. Uma delas é a de reduzir o desmatamento em 80% nos próximos seis anos. As florestas suspiram de alívio. A ONU regozija-se. Agricultores e pecuaristas são lançados contra a parede. E nós meio-cidadãos achamos que não é conosco.

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