Páginas

terça-feira, 4 de março de 2014

Falsidade

É lamentável que a cada dia precisemos tomar mais cuidado com as pessoas
que nos cercam. Isso porque confiamos e nos decepcionamos com velocidade
impressionante. Partilhamos nossos segredos, nossas intimidades, nossa
vida... crentes de que somos acolhidos, compreendidos, aceitos e
estimados. Mal viramos as costas e essa pessoa divide nossas
particularidades com outro alguém. Depois, fica difícil saber quem disse o
quê, mas o erro partiu daquele que abriu a boca primeiro. É por isso que
muitos preferem desabafar com profissionais de ajuda, alicerçados na
segurança que o sigilo pode lhes proporcionar. Pensamos que temos amigos,
mas na verdade...
Às vezes, a necessidade de fazer o outro igual a nós impulsiona a conduta
desonrosa. Denegrindo a imagem do outro pensamos aproximá-lo mais de nós,
principalmente se somos mal afamados ou inconsequentes. É mais fácil sujar
o lençol do vizinho que branquear o nosso, ainda mais se ele já está
encardido. Difícil encontrar quem deseje promover o próximo com elogios e
recomendações. É mais fácil depreciá-lo, pois assim temos a sensação de
enaltecimento próprio.
Tudo isso é muito feio e amplamente praticado em nosso meio. Valorizar as
qualidades do outro parece ser concordar com a diminuição de si mesmo.
Ledo engano. Apenas pessoas seguras e confiantes conseguem reconhecer a
grandeza do outro. Pessoas medíocres temem elogiar e invejam a postura de
pessoas sabidamente valorosas.
Um dia a casa cai e a pessoa inocente percebe que foi ludibriada,
enganada, iludida por falsas amizades. Quem perde mais é quem traiu a
confiança, pois perde um verdadeiro amigo e, sejamos francos, amigo
verdadeiro não se encontra em qualquer esquina. A pessoa vai sentir falta
da atenção, do tempo dispensado, do carinho...
Pra ser feliz nas amizades é preciso ser bom ouvinte e, acima de tudo,
saber guardar segredos. Intimidades espalhadas ao vento não são mais
segredos. A gente costuma pagar caro por ter a língua comprida e a mente
estreita. Inverte valores. Supervaloriza a fofoca e se descuida do
principal. Depois não adianta querer juntar cacos, pois mesmo colando, a
emenda vai sempre lembrar que houve a ruptura.
Cicatrizes podem servir para aprimorar relacionamentos, mas nem todas.
Algumas se prestam apenas para lembrar que não se deve mais deixar iludir.
É triste perder um amigo? É triste sim, e muito; mas mais triste é confiar
em quem não merece. A vida ensina. A vida mostra. A vida traz novos amigos
e leva aqueles que já não podem ser.
Não digo que é maldade. Por vezes, talvez seja apenas descuido, mas de
qualquer forma, tem as suas consequências. Deixar de valorizar quem nos
quer bem é um grande descuido, quase imperdoável, e pode ser claramente
sentido quando a pessoa se vai. A boca emudece. O olhar se apaga. Os
ouvidos se fecham. A falsidade é um dano e ponto.
Maria Regina Canhos (e.mail: contato@mariaregina.com.br) é escritora.
      Acesse e divulgue o site da autora: www.mariaregina.com.br.

Nenhum comentário:

Postar um comentário