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sexta-feira, 7 de março de 2014

A luta de Dosinho, internado em estado grave na UTI da Promater

 

Repórter Yuno Silva

A plenitude do reinado de Momo em 2014 está ameaçada, tanto aqui no Rio Grande do Norte quanto em Pernambuco. O desfalque na alegria geral dos foliões reflete o estado de saúde delicado em que se encontra Claudomiro Batista de Oliveira. Aos 87 anos, Dosinho, como prefere ser chamado, um dos maiores expoentes do Carnaval potiguar e recifense, quiçá do Brasil, está em coma na UTI do hospital Promater desde a última quinta-feira (27). Ironias do destino à parte, a notícia chega justamente na véspera da folia engrenar no sábado de Zé Pereira.

Joana Lima

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Aos 87 anos, Dosinho, está em coma. A notícia coincide com o período em que o compositor era sempre lembrado pela sua obra, o do carnaval.

Compositor de frevos e marchinhas, autor do hino do ABC Futebol Clube, Dosinho foi internado a primeira vez na terça-feira da semana passada (dia 18), devido insuficiência renal, e precisou voltar ao hospital por problemas respiratórios. “Desde outubro do ano passado, quando teve uma crise renal, que ele estava debilitado”, informou a esposa Lauridete Benício de Oliveira, casada há 45 anos com o cantor e compositor. “Agora teve de novo (crise renal) e precisou ser internado. Melhorou um pouco, chegou a voltar pra casa, mas reclamou da dificuldade de respirar e voltou ao hospital já em estado grave direto para a UTI”.

A esposa de Dosinho explicou que, com a saúde fragilizada, o compositor desenvolveu uma pneumonia e “de ontem (quinta-feira) pra cá a situação piorou bastante e ele foi entubado”. O quadro, segundo Lauridete, é grave: “Ele está em coma, apresentando febre e infecção”.
Amiga da família, a pesquisadora Leide Câmara, autora do Dicionário da Música do RN, disse que “infelizmente nem visita Dosinho está recebendo devido à gravidade da situação. A esposa dele me disse com todas as letras que só um milagre para salvá-lo. Muito triste isso”, lamentou Leide emocionada.
Eu não vou, vão me levando

Lauridete disse que o compositor potiguar nascido na cidade de Augusto Severo (atualmente Campo Grande), distante cerca de 270km da capital do RN, não se apresentava há alguns anos em Natal, “mas estava sempre presente no Carnaval do Recife” onde era homenageado todos os anos. Em Natal, seu nome mereceu todas as reverências durante o Carnaval de 2007. 

“Foi mais ou menos nessa época que a Banda Sinfônica Municipal lançou uma coletânea com músicas de Carnaval;  Geraldo Azevedo e Rodolfo Amaral participaram, e Alceu Valença escolheu colocar a voz em duas faixas, a que abria e fechava o disco, justamente dois pout pourris de Dosinho. Alceu se identificou na hora”, lembrou o trombonista e maestro Gilberto Cabral, um dos coordenadores do Carnaval natalense de 2014.

Do alto de seus 59 anos de carreira, autor de clássicos como “Eu não vou, vão me levando”, “Doido também apanha”, “Carnaval com Bin Laden”, Dólar na cueca” e “Não se faça de doido não”, Dosinho sempre reclamou da falta de valorização e de investimentos por parte dos gestores públicos frente à Cultura produzida no RN. Deixou de lançar discos em Natal e de tentar buscar 10% do reconhecimento que coleciona na capital pernambucana. “Mesmo se eu fosse dez, não daria conta da demanda de shows, eventos, entrevistas... lá no Recife”, declarou certa vez a esta TRIBUNA DO NORTE em entrevista publicada em 2011.

As músicas de Dosinho foram gravadas por nomes como, além de Alceu Valença, Antônio Nóbrega, Marlene, Claudionor Germano, Agnaldo Rayol e Expedito Baracho, entre outros.

O bloco Ia Mais Fiquei, que sai hoje pelas ruas de Ponta Negra, presta homenagem a Dosinho: na camisa trecho de “Eu não vou, vão me levando”. “Que notícia triste”, disse Raquel Sales, uma das organizadoras do bloco, que até então não sabia sobre o coma do compositor. “Agora que vamos pra rua com mais gás ainda pra fazer essa homenagem. Espero que ele se recupere”, disse com esperança.
A concentração do bloco está marcada para hoje, às 14h, no Bar do Naldinho - Rua Praia Jardim de Alá, Ponta Negra. A participação é gratuita e aberta ao público.

Gramado
Gilberto Cabral e Leide Câmara recordaram de um episódio inesquecível ao lado de Dosinho em 2012. “Foi uma das maiores emoções que já tive na vida, me arrepiei todinho aquele dia”, disse Cabral sobre o lançamento de projeto pelo ABC FC no estádio Frasqueirão. O trombonista fez a direção musical e os arranjos para a regravação, por Dominguinhos, do hino do clube – foi um dos últimos trabalhos do sanfoneiro, que já estava doente. “Era lançamento da música, Dominguinhos apareceu no telão lamentando não estar presente, e quando o locutor chegou para Dosinho e perguntou o que tinha pra falar aos torcedores que lotavam o estádio, ele começou a cantar à capela o hino: ‘ABC clube do povo. Campeão das multidões. Serás sempre o mais querido’. Rapaz, a torcida explodiu, foi emocionante! Dosinho está entre os melhores compositores do carnaval brasileiro; ele e Capiba”.

Emocionada, Leide contou que também estava lá no gramado naquele dia, ao lado de Dosinho. “Foi eu que cochichei no ouvido dele pra que cantasse o hino do clube. Nossa, a torcida explodiu de emoção!”.

Coletânea

Praticamente todos os anos Dosinho lança uma nova coletânea com suas principais composições, e a compilação deste ano do Carnaval do Recife, de acordo com Leide Câmara, traz a irreverente “Dólar na cueca”. Em 2005 o cantor e compositor lançou “Carnaval festa do povo”, e convidou Leide para escrever sobre o disco. Segue o texto na íntegra escrito pela pesquisadora para ilustrar o encarte do CD: “Nenhum momento  da política da vida,  passa sem que  Dosinho  registre em suas músicas o perfume do cotidiano, lançado no cheiro da saudade das alegorias imortalizadas no bloco da Saudade dos Antigos  Carnavais. 

O Compositor, nascido em Augusto Severo no Rio Grande do Norte, é considerado um carnavalesco de primeira linha, ao lado dos pernambucanos Capiba e Nelson Ferreira. Dosinho é também autor de samba-canção, músicas para campanhas publicitárias, políticas, e hinos de clubes de futebol. Autor de vários sucessos carnavalescos, além de ‘Eu não vou, vão me levando’, música muito tocada nas rádios de todo Brasil, na década de 1940, interpretada pela cantora Marlene e que  ainda hoje é sucesso no país do carnaval.

Disse Luís da Câmara Cascudo sobre sua arte: ‘Dosinho tem a linguagem musical. Diz todas as suas emoções na linha melódica, doce, clara, fácil, com uma naturalidade de fonte e uma grandeza espontânea de predestinado’. Bela obra ‘Carnaval Festa do Povo’, a música de Dosinho em seu mais novo CD.

Até o final desta edição o quadro clínico do compositor continuava inalterado.

Tribuna do Norte.

Encaminhado por Dr. Lima

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