Nas alegações finais do processo da Ação Penal 536, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, descreve de forma minuciosa e contundente o “esquema de desvio de recursos públicos” que tinha o objetivo de “financiar, de forma criminosa, a campanha à reeleição de Eduardo Azeredo”. No documento, de 84 páginas, Janot pede a condenação a 22 anos de prisão do atual deputado pelo PSDB mineiro.
A campanha à reeleição, em 1998, do então governador tucano de Minas Gerais é o objeto da ação penal. O procurador-geral considera que há “provas cabais” de autoria dos crimes de peculato e lavagem de dinheiro naquela campanha e afirma que Azeredo foi o “coordenador de toda a atividade criminosa” e possui “culpabilidade extremamente elevada”, gerando prejuízos ao erário de “consequências gravíssimas, notadamente se atualizados os valores”.
Para Rodrigo Janot, há “conjunto probatório robusto que confirma a tese acusatória e afasta por completo a tese defensiva”, referindo-se aos argumentos da defesa de Azeredo. O deputado em momento algum nega o desvio de recursos públicos de estatais mineiras, mas se diz isento de responsabilidade pelas ações da coordenação financeira da sua campanha. Segundo o PGR, o tucano teve “participação direta, efetiva, intensa e decisiva” e foi não apenas o “principal beneficiário dos delitos cometidos”, mas desempenhou “papel preponderante” no esquema.
“Chama a atenção nesse período após a eleição de 1998 a intensa troca de ligações entre Eduardo Azeredo, a SMP&B, a DNA Propaganda e Marcos Valério. Entre julho de 2000 e maio de 2004, foram 72 ligações, sendo que conversas diretas entre o réu e Marcos Valério totalizaram 57. Esse número expressivo de ligações denota, a mais não poder, um relacionamento muito próximo entre o réu e Marcos Valério, sendo mais um elemento que, somado aos demais, comprova a inconsistência da versão defensiva de que Eduardo Azeredo não teria nenhum conhecimento sobre o desvio de valores públicos para emprego em sua campanha eleitoral”, diz o documento protocolado pelo PGR no Supremo Tribunal Federal (STF) na última sexta-feira (7).
A base operacional do esquema foi a utilização de empréstimos contraídos pela SMP&B Comunicação – que tinha como sócio Clésio Andrade, então presidente do PFL e candidato a vice na chapa de Azeredo – junto ao Banco Rural, que deveriam ter sido quitados através de desvio de recursos de estatais controladas pelo governo mineiro: a Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa), a Companhia Mineradora de Minas Gerais (Comig) e o Banco do Estado de Minas Gerais (Bemge).
As estatais adquiriram cotas de patrocínio de eventos esportivos, como o Enduro Independência, que totalizaram cerca de R$ 3,3 milhões, mas apenas R$ 98 mil foram efetivamente repassados às entidades que promoveram as competições. Conforme aponta o PGR, “o patrocínio estatal (...) foi um mero ardil utilizado pelo réu e seus comparsas para dar aparente legalidade à empreitada criminosa”.
No caso da Copasa – que teve R$ 1,5 milhão (mais de R$ 4 milhões atualizados) desviados – o procurador-geral destaca que os recursos foram subtraídos “de um órgão que deveria aplicá-los no ajuste de uma das maiores deficiências da população brasileira, o saneamento básico”.
Clésio Andrade chegou a se afastar formalmente da SMP&B Comunicação no dia 7 de julho de 1998, mas isso não o impediu de assumir, como devedor solidário, os empréstimo contratados pela agência semanas depois. Janot também foi duro ao citar esse afastamento, dizendo que se tratava de “um ardil utilizado para não levantar suspeita dos delitos de peculato e lavagem de dinheiro praticados em favor da campanha à reeleição de Eduardo Azeredo”.
Dos recursos desviados e identificados pelas investigações, constam um cheque de R$ 30 mil para a Graffar Editora Gráfica Ltda., que foi responsável pela produção de material de campanha de Azeredo naquele ano; um cheque de R$ 49.331,20 para a Abril S/A, holding que controla a Editora Abril, da revista Veja; e um cheque de R$ 16.940,00 para a Sociedade Rádio e Televisão Alterosa Ltda., pertencente ao grupo Diários Associados, dono do jornal O Estado de Minas.
Em depoimento à CPI dos Correios, em julho de 2005, o publicitário Marcos Valério, sócio da SMP&B Comunicação, disse que os empréstimos não foram pagos integralmente pela campanha de Azeredo.
O total dos recursos “branqueados” – termo para se referir à lavagem de dinheiro – pela campanha de Azeredo, em valores atualizados, ultrapassa os R$ 16 milhões.
Nenhum comentário:
Postar um comentário