Páginas

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Sem explicação

Dias atrás uma tragédia abalou minha cidade natal. Membro de tradicional família jauense assassinou suas irmãs e se suicidou em seguida. No mesmo dia também faleceu o motorista Rubens, que prestava serviços ao fórum. Ele havia sido assaltado um mês antes. Essas notícias me deixaram consternada. Repentinamente, coloquei-me no lugar dessa mãe que teve três de seus filhos mortos e imaginei a dor mais profunda do mundo. Com 89 anos, certamente recebeu seu mais duro golpe. Por que, meu Deus? Com que finalidade? Rubens havia acabado de se aposentar. Fazia planos de aproveitar seus momentos livres com a esposa, e desfrutarem os anos vindouros com descanso e alguns passeios. Lamentavelmente, não houve tempo para isso. Para que a pressa, Senhor?

Eu chorei sem entender porque tinha de ser assim e, confesso, briguei com Deus. Sei que não é prudente contender com o Criador, mas dado a nossa intimidade, achei que podia ao menos expressar os meus sentimentos de indignação. Ele me fez lembrar trechos descritos no Evangelho de São Lucas. “Naquela hora, chegaram algumas pessoas e comunicaram a Jesus o que havia acontecido a diversos galileus, cujo sangue Pilatos misturara com o dos sacrifícios que ofereciam. Em resposta, disse-lhes Jesus: ‘Vocês julgam que estes galileus, por terem padecido tal suplício, eram mais pecadores do que todos os outros galileus? Eu lhes digo que não; mas se vocês não se converterem, todos perecerão do mesmo modo. Ou que aqueles dezoito homens, sobre os quais caiu a torre de Siloé e os matou, vocês pensam que eles tinham maiores pecados do que todos os outros habitantes de Jerusalém? Eu lhes digo que não; mas se vocês não se converterem, todos perecerão do mesmo modo’.” (Lc 13, 1-5)

Percebi então, que ninguém está livre da tragédia; e que ser poupado não se relaciona a qualquer possível merecimento de nossa parte. Estamos todos sujeitos ao infortúnio. Meu Deus, que estranho senso de justiça que não compreendemos? Lembrei também da passagem em que as terras de um homem rico produziram grande colheita e ele ficou pensando onde guardá-la, fazendo planos de construir celeiros maiores e, depois, aproveitar a vida. “Mas Deus lhe disse: ‘Estúpido! Nesta mesma noite sua vida vai ser requisitada! Para quem vai ficar o que você ajuntou?’.” (Lc 12, 16-20)

Disso tudo, tirei uma lição. A vida acontece hoje, agora. Amanhã pode não existir. É por isso que precisamos nos concentrar nas possibilidades presentes, fazendo sempre o nosso melhor. Meu entendimento quanto à justiça divina continua comprometido, mas me sinto aliviada por não ter que decidir o futuro da humanidade. Certamente não seria capaz de decifrar o que se passa em cada cabeça e em cada coração. Peço perdão pela natural arrogância dos seres humanos (dentre os quais obviamente me incluo) em querer saber e entender tanto quanto o próprio Deus. Peço perdão também pelos pecados cometidos e por aqueles que ainda vamos cometer. Tem piedade de nós, oh Pai! Envolve-nos com a sua infinita misericórdia.

Maria Regina Canhos Vicentin (e.mail: contato@mariaregina.com.br) é escritora.

Nenhum comentário:

Postar um comentário