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sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Eu sinto isso

Faz algum tempo que ando observando a dificuldade que as pessoas possuem
de identificar e assumir seus sentimentos. Primeiro porque elas confundem
sensações com sentimentos, depois porque lhes falta coragem para dizer o
que realmente sentem. Isso as prejudica demais, pois ninguém tem bola de
cristal para adivinhar o que se passa no íntimo de nós. Seguimos
equivocados e causando equívocos em relação ao que sentimos e pensamos.
Assumir nossos sentimentos é o primeiro passo para estabelecer uma relação
autêntica, seja ela amistosa, profissional, ou amorosa.
Talvez, a chave do mistério seja compreender o que nos leva a omitir, até
de nós mesmos, os nossos reais sentimentos. É o medo! Medo de ser
ridicularizado, humilhado, diminuído. Basta lembrarmos quantas vezes
hesitamos em perguntar uma dúvida ao professor em sala de aula, temendo
que os demais nos considerassem ignorante. Ou quantas vezes adiamos aquele
telefonema convidando para um passeio com receio de ouvir um “não”.
A verdade é que ninguém deseja ficar “por baixo”. Temos a ideia de que
assumir sentimentos é expor-se de modo irremediável, tornando-nos
vulneráveis. De certo modo isso faz sentido, pois quando se tem
conhecimento do que o outro pensa e sente fica mais fácil atacá-lo no
ponto crítico, e muitos não hesitam um minuto sequer em fazer isso quando
desejam magoar e ferir. Então, o segredo é se preparar para lidar com
ataques e críticas ao sermos sinceros. Isso requer investimento,
principalmente de tempo, para fortalecer nossa autoestima e convicções.
Nesta altura, muitos já devem estar pensando que é melhor ficar do jeito
que se é, pois mudar e assumir o que se pensa e sente dá muito trabalho.
Olha, não vou mentir, dá trabalho sim; mas compensa, pois a gente passa a
ser mais autêntico e corajoso. Passa a se importar menos com a opinião dos
demais e mais com a nossa. Encontramos com facilidade pessoas similares
enquanto automaticamente repelimos aquelas que não têm sintonia conosco e
nossa forma de pensar e agir. Ou seja, poupamos tempo de procura em todos
os aspectos de nossa vida.
Quantas pessoas se queixam que não conseguem encontrar um amor, um amigo,
ou um bom emprego. Mas, quantas delas deixam claro o que realmente buscam?
Quantas mascaram suas reais intenções? Muitas; quase todas. A sinceridade
é qualidade em extinção. Seja para se preservar seja para se sobressair, a
maioria das pessoas mente. E mente descaradamente. Inventa para não
assumir sentimentos, para não correr o risco de parecer ridículo, para não
ficar “por baixo”. A opinião dos outros vale mais que a nossa, e delegamos
aos demais o julgamento sobre a nossa pessoa, como se alguém pudesse nos
conhecer mais e melhor que nós mesmos.
Enfim, as coisas seguem por um caminho ruim. As pessoas se distanciam umas
das outras. Os relacionamentos se tornam frívolos, superficiais, falsos. A
essência é verdadeira, mas ela não aparece, fica escondida. Poucos possuem
coragem para assumir quem são e o que sentem; o que desejam. E quando o
fazem, correm o risco de não ter a contrapartida, pois a maioria prefere
fingir. Vale à pena refletir sobre isso, para que aos poucos não deixemos
de viver, trocando a vida real pela vida do faz-de-conta. Hoje em dia, eu
poderia até dizer: vida virtual. Comecemos a assumir nossos sentimentos,
nossas opiniões, para que as pessoas possam realmente nos conhecer e
encontrar afinidades. Eu sinto isso... Já é um bom começo!
Maria Regina Canhos (e.mail: contato@mariaregina.com.br) é escritora.

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