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quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Isto não é uma guerra!

Agência Estado

O Rio de Janeiro vive dias pertubadores desde o último domingo. Nos últimos cinco, a sopa de letrinhas  (ADA e CV, respectivamente Amigos dos Amigos e Comando Vermelho) que domina o tráfico resolveu aterrorizar os munícipes e o poder público da cidade e do estado e implantar o terror. Por enquanto são mais de 25 mortos e cerca de 40 veículos incendiados. Milhares de alunos prejudicados, pessoas voltando para casa mais cedo e com muito medo, mais do que o normal.

Ao que tudo indica, esta foi a reação de um tráfico acuado, imprensado pelos neo-traficantes milicianos e pelas UPPs (Unidades de Polícia Pacificadoras). Perderam boa parte do seu faturamento e, por isso, se uniram contra o inimigo comum, para reaver áreas que estavam antes sob seus controles.

Se por um lado isso significa que as UPPs estão dando realmente certo, por outro indica a falta de uma política de segurança pública, estruturante, global, que enfrente os problemas de não maneira pontual, mas nos múltiplos sentidos e vetores que o assunto exige.

Ora, se isso realmente tivesse sido feito, a reação dos criminosos ou não existiria ou seria muito menor. Quando, e se, o estado fluminense conseguir controlar esses atos, mediante assassinatos e execuções (que ficarão impunes, como vimos em São Paulo quando o PCC agiu) haverá apenas uma migração de localidade e mudança de métodos. Os grupos criminosos, organizações pré-mafiosas agirão em outra base geográfica, e com novos modelos de negócios. Menos violentos? talvez, mas a repressão não elimina as drogas e só aumenta a insegurança.

O que fazer? Um começo: Reforma das polícias, treinamento humanista, cadeias decentes e não depósito de corpos (preciso lembrar onde nasceram o CV e o PCC?), política de reintegração de presos, inteligência policial que vá atrás do dinheiro ilegal (Ah! mas isso pegaria também grandes tubarões por aí, não? Para estes criminosos do “bem”, penas alternativas.

De um lado fuzis de assalto, submetralhadoras e toda sorte de equipamento pesado, do outro caveirão, blindados e fuzis de assalto. No meio de tudo isso, uma sociedade acuada, na linha de fogo. Mortes e mais mortes por “balas perdidas” (expressão fantástica que oculta que bala realmente saiu de uma arma, que teve um dedo que puxou gatilho), mais violência e mais repressão, seja dos criminosos seja do Estado.

É óbvio que as ações dos traficantes, a tentativa de implantar o terror na população, tem que ser debeladas, rapidamente. O que preocupa é a maneira e o custo humano. Isso não pode ser encarado como uma guerra, com oponentes a abater e território a ocupar. No meio dos lados em confronto existe uma população que só vê a face do Estado através da polícia. Que tem suas portas arrombadas sem mandato judicial, que sofre duplamente, que vê suas casas varadas por balas, tiros vindo de cima do morro ou de baixo, disparados a esmo.

A cobertura da mídia, as palavras divulgadas, as declarações de alguns responsáveis se referem a uma guerra. Não! Não é e não pode ser encarado como uma guerra, com um exército que tem que destruir o outro lado, ocupar um território, e passar por cima de quem estiver no caminho, “inimigos” ou civis.

A segurança pública carece de ações e controle públicos. Necessita de prevenção, debate, e escolhas de caminhos a se trilhar, e não simplesmente reagir a tiros com tiros. Perguntar os “por quês” da situação em que nos encontramos é fundamental.

Enquanto escrevo este texto, blindados da marinha (usados nas guerras do Vietnã e do Iraque) estão sitiando a Vila Cruzeiro (principal reduto dos traficantes que fugiram das áreas nas quais as UPPs foram instaladas), e o Bope chega com calibre 0.50. O estrago dessa arma é impressionante, podendo atravessar várias paredes. Vão usar isso contra a população da Vila Cruzeiro?. Não sei, espero que não.

Que se reaja a mais essa afronta ao Estado de Direito, mas dentro dele, dos seus limites. O Estado não pode, em nenhuma hipótese e sob nenhum argumento, agir à margem das leis existentes. Que o tráfico o faça, é inerente à sua condição de ilegalidade (como já expliquei em uma outra coluna). Que o Estado o faça é uma confissão de culpa, de despreparo, e de autoritarismo e de desdém pela sociedade, tão típico pelas bandas de cá. Que a sociedade aplauda é o sinal dos tempos, de nossa debilidade.

Por enquanto só nos resta aguardar os acontecimentos e torcer para que a paz, a pacificação, não seja edificada sobre os mortos. Não podemos aceitar a paz dos cemitérios.

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