Por Helena Chagas, no Divergentes e para o Jornalistas pela Democracia
Não se pode destruir o que nunca existiu, caso da base parlamentar do governo Bolsonaro. Mas, ainda que Michel Temer seja solto nas próximas horas, e que a pirotecnia das prisões desta quinta tenha feito sombra sobre as más notícias que atingiram o Planalto na semana, está claro que o episódio deixa Jair Bolsonaro muito mais distante das condições de governabilidade necessárias para seguir em frente. Antes de tudo, pela reação do próprio presidente, que aproveitou o momento para achincalhar a própria governabilidade.
Governabilidade é uma palavra gasta, usada predominantemente pelos políticos que querem obter concessões em troca de seus votos no Congresso, que evoca toma-lá-dá-cá e outros hábitos ruins. Mas não inventaram outra melhor para definir a capacidade do presidente da República de reunir apoio no Legislativo para aprovar sua agenda, governar e, sobretudo, sobreviver nos seus quatro ou até oito anos de mandato. A história recente do presidencialismo à brasileira, com dois impeachment presidenciais em menos de 25 anos, não deixa dúvidas.
Bolsonaro poderia ter saído pela tangente no episódio Temer. Mas Bolsonaro é Bolsonaro. Num momento para lá de complicado, em que o conjunto da obra das ações políticas do Planalto já desenhava uma situação preocupante em relação à Previdência, ele mostrou que tudo sempre pode piorar. Atribuiu a prisão de Temer a atitudes relacionadas aos "acordos pela governabilidade" da velha política, disse uma obviedade ("a Justiça é para todos") e reafirmou sua intenção de não fazer os tais acordos pela governabilidade.
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Bolsonaro errou, porque a investigação que levou o ex-presidente para a cadeia não parece ter uma relação tão direta com acordos pela governabilidade, mas sim com propina e corrupção. E chutou o pau da barraca, já meio despencada, atingindo os únicos que poderiam ajudá-lo a formar uma base de apoio: fustigou o DEM de Rodrigo Maia – que passou recibo imediato de sua irritação por essas e outras ofensas -, o MDB de Michel Temer e Moreira Franco, o Centrão de tanta gente que já está presa e etc.
Juntando-se a esse pessoal o PT de Lula, o PDT de Ciro Gomes e o PSDB de Tasso Jereissati – eles se manifestaram considerando a prisão do adversário arbitrária – tem-se um caldo grosso de animosidade no Legislativo. O PSL de Bolsonaro festejou a prisão de Temer, mas não gostou do projeto da Previdência dos militares, cheio de concessões, e nem está gostando de não ter os ministérios, cargos e vantagens que esperava. Problema, aliás, que atinge praticamente todos os partidos da base potencial de Bolsonaro.
Soma daqui, puxa dali, noves fora, e se conclui que Bolsonaro, que já tinha um governo de base zero, pode acabar agora com base parlamentar negativa – algo extremamente grave para quem não completou ainda três meses de governo. O que vai acontecer ninguém sabe, mas já dá para arriscar no que não vai acontecer: a reforma da Previdência de Paulo Guedes tomou o rumo da lata de lixo, e o que sair dali, se sair, vai estar bem distante dos R$ 1 trilhão sonhados pelo ministro da Economia.
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