
A indicação de um ministro para o STF é uma das mais altas e exclusivas
prerrogativas do presidente da República. Trata-se da escolha de um juiz que
será guardião da Constituição e dos direitos, deveres e garantias dela emanados,
não de um auxiliar de governo. Com a morte de Teori Zavascki, entretanto,
instalou-se um disputa despudorada entre grupos de interesse para emplacar o
nome do novo ministro. E como além do pudor o país está perdendo também a
capacidade de espantar-se com as condutas desatinadas, assiste com naturalidade
aos movimentos lobistas. Um auxiliar de Temer recebeu uma lista de indicações
subscrita por dois juristas que apresentaram o pedido de impeachment da
ex-presidente Dilma e por movimentos de extrema direita que participaram da
cruzada pelo golpe. Imagine se no tempo de Lula ou Dilma a CUT e outros
movimentos sociais fossem ao Planalto fazer lobby pela indicação deste ou
daquele nome para o Supremo? Seria um escândalo estrepitoso.
O lobby da Fiesp para emplacar Ives Gandra Filho é outra imoralidade. Em que
país civilizado os representantes da elite econômica atuam para emplacar
ministros da corte maior de justiça, onde grandes conflitos de interesses, em
algum momento, serão julgados? O homem é machista e homofóbico mas o patrocínio
de sua indicação é escandaloso. Devia ser. Mas tudo parece natural, assim como
a sanha do PSDB e mais cinco partidos para emplacar na vaga de Teori o ministro
da Justiça, Alexandre de Morais.
E por falar nele, voltemos ao despudor. Depois da renúncia dos sete
integrantes do Conselho Penitenciário, ele justificou que eram todos ligados ao
governo Dilma. E complementou, com absoluto desprezo pela inteligência alheia: o
conselho é um órgão de Estado, não de governo. Sendo de Estado, não importa a
origem dos conselheiros, e sim a competência e o perfil técnico para integrarem
o órgão supervisor da política penitenciária. A trombada dos conselheiros com
o ministro foi por conta de sua insistência em transfererir recursos do fundo
penitenciário, apesar dos caos nos presídios, para o fundo de segurança pública,
que subsidia as atividades policiais. Antes, ele havia ampliado o conselho para
obter a maioria, e os novos integrantes lhe rasgaram elogios despudorados. São
conselheiros governamentais, não de Estado.
O Supremo, em recesso e ainda sob o choque da morte de Teori, assiste calado
ao leilão da toga de Teori no mercado fisiológico. Um de seus ministros, Gilmar
Mendes, há tempos perdeu o pudor de explicitar seu alinhamento político e cumpre
com naturalidade o papel de conselheiro do presidente da República. Com absoluto
despudor, o Planalto faz vazar a informação de que o governo não gostaria que a
presidente do STF, Cármem Lúcia, homologasse logo a delação da Odebrecht. O
Planalto aproveita a morte de Teori para ganhar tempo em relação à Lava Jato,
como disse candidamente o ministro Eliseu Padilha.
A Comissão de Anistia, órgão de Estado, foi renovada para tornar-se um
apêndice governamental. Quem tem processos pendentes, por ora esqueça a
conquista da reparação por crimes da ditadura. A EBC é um órgão de Estado,
responsável pelo sistema de comunicação pública. Virou agência de comunicação
governamental chapa branca e cabide de empregos para apaniguados. E assim vamos
com o desmonte geral da cultura republicana que ainda era incipiente mas
prometia avançar. Mas a roda da História andou para trás.
http://www.brasil247.com/pt/blog/terezacruvinel/276997/Notas-sobre-o-despudor-da-era-Temer.htm
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