
© Divulgação / BRICS Rio
A
imposição de mais tarifas do governo norte-americano a outras nações —
entre elas o Brasil —, previstas para começarem a valer no mês de
agosto, bate à porta. Países do BRICS estão entre os que sofrerão com as
sobretaxas. Entretanto, para analistas, algumas soluções podem ser
encontradas dentro do próprio grupamento.
O BRICS é alvo de preocupação do presidente dos EUA, Donald Trump,
embora isso não seja admitido diretamente. Na esteira da Cúpula no Rio
de Janeiro, o líder americano deu certa demonstração de seu incômodo ao
dizer que taxaria países do BRICS em 10%, justificando que o grupo foi criado para "destruir" o dólar norte-americano.
A
política de sobretaxas, entretanto, não parou por aí. No dia 9 de julho
Trump deu declarações de que direcionaria ao Brasil uma tarifa de "50% sobre todos e quaisquer produtos brasileiros enviados aos Estados Unidos".
Em carta ao governo brasileiro, o presidente americano apontou o
processo contra o ex-presidente Jair Bolsonaro como um dos motivos pelo
qual aplicava tal medida.
Nesta quarta-feira (30), Trump oficializou a ordem que impõe o tarifaço ao Brasil.
O decreto passa a valer a partir do próximo dia 6 de agosto. Alguns
produtos ficaram de fora, conforme adiantou ontem (29) o secretário de
Comércio dos Estados Unidos, Howard Lutnick. Além do Brasil, tarifas à Índia também foram confirmadas pelos americanos. A lista inclui alimentos como a castanha-do-pará e o suco de laranja.

Ontem, 17:46
Para Bernardo Kocher,
professor de história contemporânea da Universidade Federal Fluminense
(UFF) e pesquisador do Núcleo de Estudos dos Países BRICS (NuBRICS), a
nova política tarifária do governo Trump "é tudo menos uma política
comercial".
A medida de Trump, conforme o analista, "tenta reverter a perda de importância estratégica dos EUA ao impor um custo adicional
à riqueza social produzida que seria repassada para o governo
americano. Este formaria uma espécie de 'fundo' com esta riqueza
monetária extraída tanto dos produtores quanto dos trabalhadores de todo
o mundo, inclusive dos EUA".
Ou
seja, a grande questão para os americanos diante de toda a movimentação
em torno da tarifação das importações visa, no entendimento do
historiador, "acumular recursos financeiros pelo Estado americano com o
fim de criar instrumentos para lidar com a vertiginosa ascensão da China na economia mundial e a vitoriosa ação militar (além da sua incolumidade às sanções aplicadas contra a sua economia) da Rússia na Ucrânia".
Quais as alternativas para os países BRICS mitigarem os efeitos do tarifaço?
Os
impactos iminentes das sobretaxas deverão exigir rearticulações dos
países para rearranjar os produtos antes enviados aos Estados Unidos. No
caso do Brasil, em 2024, as exportações para o território americano
representaram cerca de 12,55% das vendas realizadas para outros países, ultrapassando US$ 40 bilhões
(aproximadamente R$ 223 bilhões). Já para a Índia, no mesmo período, o
comércio com os EUA representou quase 20% de suas exportações, avaliadas
em US$ 87,4 bilhões (pouco mais de R$ 487 bilhões).
De acordo com analistas, uma das possibilidades evidentes para os países do BRICS mitigarem eventuais prejuízos é ampliar o comércio dentro do grupo.
"A
sobretaxa imposta pelos Estados Unidos pode atuar como catalisadora de
mudanças e, com isso, acelerar as medidas previstas na 'Declaração
Conjunta do BRICS sobre Segurança Alimentar', especialmente aquelas
voltadas à redução de barreiras ao comércio de produtos agrícolas",
disse Augusto Rinaldi, professor de relações internacionais da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
Na
referida declaração, os países se comprometeram a facilitar o comércio
agrícola intrabloco por meio da eliminação de barreiras não-tarifárias
desnecessárias; harmonização de normas sanitárias e fitossanitárias; certificação digital de produtos agropecuários; melhoria na transparência regulatória; e redução de burocracias aduaneiras. Tais compromissos foram firmados com o intuito de tornar o comércio mais ágil e seguro.
Agora, diante da imposição de taxas americanas, "o senso de urgência e a convergência política interna no BRICS" devem aumentar, segundo o analista, o que permitiria aos países "redirecionar parte de suas exportações para mercados parceiros no BRICS,
estimular cadeias de valor regionais e que dependam menos de mercados
vulneráveis a decisões unilaterais como as dos EUA, e ganhar margem de
manobra política e econômica frente às pressões externas".

2 de maio, 15:10
Kocher
ressalta que o grupo é não é um bloco comercial, muito embora a
atividade econômica seja uma de suas principais atividades. Portanto, "a integração comercial neste nível levaria vários anos para ser implementada".
"Uma
pactuação de preços entre os membros do BRICS talvez deva ser feita por
fora das leis de mercado, com a intenção de absorver a produção
brasileira por parte dos membros do grupamento com maior poder de
compra. A China já fez contato com empresários brasileiros para tentar
absorver a produção que se tornaria (caso as tarifas realmente entrem em
vigor) excedente".
Augustini cita, além da baixa absorção dos produtos que o BRICS deve passar, a possibilidade de retaliações por parte de Washington
sobre países que ainda continuam a depender muito do mercado
norte-americano. Tais fatores também são impeditivos, no atual cenário,
de um acordo intrabloco que possa ser altamente compensatório, segundo
ele.
Apesar dos desafios, o professor da PUC cita a bolsa de grãos proposta durante a Cúpula do BRICS em Kazan no ano passado e um investimento do Novo Banco de Desenvolvimento — este mais complexo, conforme o analista.
O
intuito do aporte financeiro, segundo ele, seria para "oferecer linhas
de crédito específicas para subsidiar exportações dos países do BRICS,
apoiando empresas e setores que precisem se adaptar às novas rotas
comerciais e financiar obras de infraestrutura necessárias para
viabilizar a redistribuição de fluxos comerciais, tais como portos,
ferrovias, armazéns. Isso inclui o apoio a pequenos produtores
potencialmente afetados pelas perdas externas", sugere.
No caso do Brasil, mercado interno poderia absorver parte das exportações?
De
acordo com Kocher, parte da produção destinada ao mercado externo
poderia, sim, ser incorporada ao mercado interno. Porém, questões
complexas como o próprio domínio do agronegócio poderiam causar resistência, inclusive de classes políticas, sendo necessários rearranjos políticos.
Entretanto,
algumas alternativas podem ser consideradas, conforme cita Augustini.
Entre elas, adotar políticas de compras públicas, ou seja, "o governo
ampliar programas de compras para absorver os excedentes disponíveis – adquirindo, por exemplo, grãos, carnes e sucos para formar estoques reguladores e distribuir em programas de assistência social e escolas".
Além
disso, para promover a absorção interna num curto prazo, o analista
sugere a redução de impostos sobre alimentos básicos, com o objetivo de
baratear o preço ao consumidor final e aumentar o consumo interno desses
insumos. Outra proposta seria "adotar políticas de renúncia fiscal às empresas produtoras para que não demitam trabalhadores e continuem a operar conforme planejado, de modo que suas operações sejam afetadas com menos intensidade", acrescenta.
Fonte: https://noticiabrasil.net.br/20250730/tarifas-dos-eua-podem-funcionar-como-catalisadora-de-mudancas-para-o-brics-diz-especialista-41851650.html
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