247 - O ex-ministro José Dirceu, que está preso no centro de
detenção em São José dos Pinhais, escreveu artigo com duras críticas ao governo
de Michel Temer.
Em texto divulgado pelo jornalista Breno Altman em
seu
Facebook, José Dirceu diz que o país vive sua catarse regressiva. "O governo
faz tudo para implantar a agenda da regressão, da supressão dos direitos sociais
e dos trabalhadores: a PEC dos Gastos, a Reforma da Previdência, a terceirização
da mão de obra. No entanto, nem uma palavra sobre os gastos com a dívida interna
e as despesas financeiras, os juros médios de 14%, os juros da dívida de 4,5% na
melhor das hipóteses, 7,5% nos piores anos!", afirma.
Leia o artigo na íntegra:
SOBRE A REFORMA DA PREVIDÊNCIA
por José Dirceu
O país vive sua catarse regressiva. Para além da ilegitimidade do governo, as
chamadas reformas avançam, tal qual em 1967-69, sustentadas — tanto elas quanto
o governo — pela maioria parlamentar que se formou desde o pacote de maldades, o
que inviabilizou o ajuste fiscal de Dilma, pelo MPF/Judiciário e pela mídia. A
coalisão PSDB-PMDB retoma a agenda da era FHC e, agora, com o ex-PFL/DEM como
sócio menor, com o centrão jogando o papel de sempre. Para completar o cenário,
os rentistas e o capital bancário financeiro, os oportunistas e carreiristas de
sempre, o empresariado pato e as classes médias assistem, alguns com renovado
cinismo e outros estupefatos, o processo de bombardeios das conquistas sociais.
Afinal, não estavam lutando contra a “corrupção”?.
Assistem ao espetáculo sofrível do governo Temer. Mas saem em sua defesa e
lhe dão sustentação, alguns de forma envergonhada, outros aderindo com prazer,
jogando no lixo a luta contra a corrupção. Por que não, se até o STF e o MPF
buscam meios de preservar Temer e o tucanato?
O governo faz tudo para implantar a agenda da regressão, da supressão dos
direitos sociais e dos trabalhadores: a PEC dos Gastos, a Reforma da
Previdência, a terceirização da mão de obra. No entanto, nem uma palavra sobre
os gastos com a dívida interna e as despesas financeiras, os juros médios de
14%, os juros da dívida de 4,5% na melhor das hipóteses, 7,5% nos piores anos!.
Vamos à PEC dos Gastos. Sua justificativa é a busca do equilíbrio das contas
públicas, cujo primário foi de +2,1 em 2007, +1,8 em 2012, +1,4 em 2013, notem
-0,8(?) em 2015 (ano eleitoral), -1,9 em 2015. 2016 se encerrou com déficit de
R$ 159 bilhões, -3,1 do PIB. Ano, portanto, atípico pelas razões conhecidas:
golpe, locaute de investimentos, sabotagem do ajuste fiscal de 2015, farsa de
aumentos dos salários do serviço público, choque de preços administrados e de
alimentos, queda do preço das commodities, retirada do grau de bom pagador do
Brasil e por aí vai.
O pânico e o medo mais o desemprego fez o consumo desabar. Normalmente, sem a
guerra política movida contra o governo Dilma, a recessão seria igual ou pouco
maior que a de 2014 e não de -3,5%. Ou falácia, Dilma fez superávit em 2012,
2013 e 2014, pequeno é verdade, mas não incompatível com os juros pagos que em
2012 foram de 3,1%; em 2013, de -3,5%; e em 2014, de 4,4%. O déficit nominal
foi, respectivamente, de -1,3, em 2012, -2,1 em 2013, -4,7% em 2014, -8,6, em
15, e, em 16, na mesma escala entre 7,6% e 8,6%. Anos atípicos com a economia em
choque político.
Perco esse tempo para demonstrar a inutilidade do PEC dos Gastos e seu
verdadeiro objetivo, já que bastaria uma reforma tributária e uma outra política
de juros para equacionar o déficit nominal e o crescimento da dívida pública.
As contas da Previdência
É preciso considerar o peso da queda da arrecadação e dos juros da dívida em
2014, 15, 16 para entender o aumento do déficit nominal e mesmo primário. Não
houve nenhuma mudança significativa nesses anos, nem nos dez últimos, na despesa
com pessoal e ou custeio. Nada de extraordinário com as despesas da Previdência,
fora o fato de que, com 12 milhões de desempregados, caem as contribuições e
aumentam os benefícios.
Exemplo: a Previdência Urbana em 2012, 13 e 14 teve superávit de 0,5% do PIB;
a Rural, déficit de 1,5% em média entre 2012 e 15; e a dos servidores idem.
Então, os 3% de déficit, mais ou menos R$ 180 bilhões, estão concentrados na
Previdência Rural, que só arrecada contribuições de 0,1% do PIB, e a dos
servidores, 0,2%. Para uma despesa-benefícios de 1,8% em 2015, a Rural pagou
1,7%. Em 2016, a Previdência Urbana deu déficit pela primeira vez, -0,7%, mais
ou menos R$ 50 bilhões.
A PEC dos Gastos visa cortar 4% do PIB nos próximos anos. Pelos cálculos da
FGV/IBRE, daqui a dez anos as despesas do governo federal, pelas regras atuais,
seriam de 24,5% do PIB. O objetivo da PEC é reduzir essa despesa para 17,4% em
2022 (fim do mandato do presidente eleito em 2018).
Onde cortar esses 4% ou 7%? Os investimentos já estão na lona. Então, na
lógica desse governo sobram Previdência, LOAS, BPC, e o salário do servidor
terceirizado. Nunca das carreiras estratégicas do Estado, beneficiadas em 2016
com aumentos de 19% a 40%: juízes, procuradores, delegados, defensores,
gestores, diplomatas e por aí vai. Privilégios, legalistas, castas!
Ilegalidades! Venda de férias, licenças prêmios, auxílios livros, estudos,
creches, habitação, planos de saúde, moradia. Verdadeiros marajás!
Daí as vergonhosas propostas, covardes, de aumentar a idade de aposentadoria,
exigir até 15 anos a mais de trabalho para receber a integral, desvincular os
benefícios do BPC e rurais do salário mínio. São 8,5 milhões de aposentados
rurais e 3,5 milhões de beneficiários do BPC. Alguém pode aceitar tamanha
infâmia, sabendo que é o mínimo para a sobrevivência desses brasileiros, fora o
papel no PIB e no desenvolvimento local desses benefícios? Um crime!
Não há país no mundo em que a Previdência se autofinancie. 1,5% do PIB para a
Previdência é o mínimo! Que se reforme a ferro e a fogo a Previdência dos
servidores públicos, que se ponha fim aos escandaloso regime desigual dentro do
funcionalismo público, sem o absurdo de elevar a alíquota de 11% para 14%, por
exemplo, nos estados que mal pagaram salários.
Os 4% ou 7% virão da liquidação da luta contra a pobreza, Bolsa Família, BPC,
LOAS, Previdência Rural e Urbana?
Se não cabe no Orçamento Geral e da Seguridade Social nosso sistema de
Previdência, Assistência e Saúde, não podemos simplesmente num país com as
desigualdades como o nosso, sem ouvir o povo, fazer na prática um desmonte desse
Estado Social.
Por que não taxar os ricos? O país não pode fazer uma reforma tributária e
reduzir os juros? Vamos pagar 5% de juros para uma minoria já rica ou de classe
média, que tem seguro saúde, previdência privada, imóveis, renda de juros
aluguéis, dividendos? Por que não pagar 2% ou mesmo 1%?
Nosso déficit é fruto dos juros pagos à dívida interna. R$ 350 bilhões em
média por ano, chegando a R$ 560 bilhões em alguns anos. Fizemos superávit
fiscal desde o segundo governo FHC, à exceção de 2015 e 2016, nas condições de
crise política e econômica. A dívida pública subiu de 56% para 70% do PIB por
causa dos altos juros e não por causa dos gastos públicos.
Devemos reduzir os gastos ou aumentar as receitas? Os dois, reduzir os gastos
com juros e aumentar as receitas invertendo o caráter de nossos tributos hoje
regressivos e indiretos. Que os ricos paguem pela crise e não só os pequenos e
os trabalhadores, e pior, os aposentados, os pobres e as pessoas com
necessidades especiais.
É verdade que o déficit da Previdência e da seguridade social cresce chegando
a R$ 257 bilhões em 2016. Com receitas de R$ 617,7 bilhões (incluindo as
contribuições sociais – COFINS, PIS/PASEP/CSLL, e todas contribuições, urbanas,
rurais, servidores e ainda loterias) e despesas R$ 874,7 bilhões (Previdência,
saúde e assistência social). Mas atenção, R$ 91 bilhões foram retirados pela DRU
e as renúncias fiscais levaram outros R$ 58,6 (com as desonerações chegaram a R$
158 bilhões em 2015); isso, sem falar nas dívidas das empresas e na sonegação.
Logo o déficit seria, em 2016 — repito, ano atípico —, de R$ 106,7 bilhões. Até
2013, o déficit da seguridade social era mínimo. Por exemplo, em 2013 foi de R$
83,7 bilhões, mas a DRU tirou R$ 60,1 bilhões, logo seria R$ 23,6 bilhões; era
R$ 22 bi em 2012, R$ 13,2 bi, em 2011. O estoque da dívida ativa foi de 351
bilhões em 2015. A sonegação e dívida de empregadores em 2016 foi de 91 bilhões
de reais.
Esses dados estão num artigo lúcido de Ribamar Oliveira, no "Valor
Econômico”" de 16 de fevereiro, escrito para responder a nós que afirmamos que
não se pode falar em déficit da Previdência sozinha, já que a Constituição de
1988 criou a Seguridade Social financiada pelas contribuições previdenciárias e
sociais, como já explicamos. Mas o jornalista sabe que chegamos a um sobrejuro
absurdo na contramão de todos os países desenvolvidos, onde se paga juros
negativos ou irrisórios, 1%, 2%, a médio ou longo prazo.
Essa iníqua e injusta situação, quase uma desapropriação de renda nacional,
seu sequestro para uma minoria, tem que cessar, assim como o iníquo sistema
tributário nacional.
O grave desta situação, no caso da DRU, desonerações, dívidas das empresas,
sonegações, é que a Saúde Pública, financiada pelo orçamento da seguridade
social, como demonstra Ribamar Oliveira, é a principal atingida. Crescem as
despesas da Previdência e caem as de Saúde.
Aliás, um estudo do Ministério da Fazenda mostra que a saúde representa 9%
dos gastos federais, e a Previdência, assistência social e trabalho, 48%.
Assim, realmente a PEC dos Gastos coloca a Saúde Pública, o SUS, em risco, já
enfraquecidos pela criminosa extinção da CPMF. Fora o fato de que a reforma da
Previdência proposta e a PEC dos Gastos, irmãs gêmeas, promovem e estimulam, na
prática, uma corrida para os planos de saúde e para a previdência privada.
A questão de fundo é o rompimento do pacto constitucional de 1988,
gravíssimo, sem consulta popular. A convocação de eleições e Constituinte,
precedida de uma reforma política via plebiscito ou referendo é uma exigência
legal, democrática e única para restabelecer a legalidade, legitimidade e o
pacto social e constitucional.
O Brasil e suas classes sociais, seu povo, tem que decidir que Estado e
sociedade querem, quem financia e o quê – daí a necessidade de reformas do
Estado, Tributária, Previdenciária e Social, decidida nas urnas. De colocar na
pauta de debates temas como aborto, união civil de homossexuais, Polícia
Militar, Sistema Penal e Penitenciário, drogas (descriminalização e
legalização), e, principalmente, nosso Estado de Bem Estar Social e seu
financiamento.
Numa Constituinte poderemos, de uma vez por todas, colocar um fim nessa
verdadeira rapina via juros altos, o instrumento da maior concentração de renda
de nossa história recente! Em dez anos, 50% do PIB, R$ 3,5 trilhões foram pagos
em juros! Para quem? No máximo 2% da população ficou com 70%, 80% desse total!
A verdadeira guerra fiscal é a dos rentistas que não aceitam juros reais
menores de 5%, impondo ao país – refém deles – juros altos e déficits públicos
nominais, apesar dos superávits registrados durante 15 anos.
No nosso caso era necessário elevar os juros a 14,5%? Ah, é verdade que temos
que pagar juros reais de 5%! Às vezes, e muitas delas, de 10%, 15% e até 27,5%
como na era Gustavo Franco, quando apesar de aumentar a carga tributária,
privatizar, dobrarmos a dívida pública. Qual é a responsabilidade da crise
política fomentada e produzida pelos golpistas na queda do PIB, aumento da
inflação, desemprego e déficit público com a queda brutal da arrecadação e
aumento serviço da dívida?
Não foram os que hoje governam que exigiram, em 2014, um ajuste fiscal
recessivo? O choque de preços administrativos, lembram? O aumento dos juros, o
câmbio desvalorizado e o corte brutal de investimentos? Pior com corte de
crédito, decorrência da explosão inflacionária e a recessão que terminou o ano
de 2015 com um PIB de – 3,5%.
Produziram o maior desemprego, endividaram as empresas que, com a queda da
demanda, o aumento dos estoques, cortaram os investimentos. Os bancos cortaram
os créditos e aumentaram ainda mais os juros; os consumidores, em pânico com o
desemprego e o risco de insolvência, da perda do carro, da casa própria, pararam
de comprar, até porque o crédito desapareceu!
Eis o quadro atual de nossa economia, uma vez que nada mudou em 2016: queda
de 4,49% no PIB, desemprego de 12,4% e, pela brutal recessão, inflação de 6,49%.
Agora, o que vemos é um governo paralisado – fora as reformas é lógico –, com
déficit de assombrosos R$ 159 bilhões em 2016 e R$ 127 bilhões prometidos para
2017, mas com o compromisso firme de manter os juros reais nos 5% famosos, taxa
“mínima” para viabilizar, segundo eles, a solvência do governo. Portanto, uma
Selic entre 9% a 10%.
Não basta, ainda que necessário, só o “Fora Temer”. É hora de ir para as ruas
e chamar os trabalhadores, todos aqueles que se opõem ao golpe e ao desmonte da
Previdência, seguridade e saúde, à luta, seja protestando, seja exigindo
eleições já e uma Constituinte. Vamos buscar, encontrar, abraçar a corrente
humana de brasileiros que apoiam Lula e seu legado, que querem ELEIÇÕES JÁ!
Vamos à luta
http://www.brasil247.com/pt/247/brasil/287399/Dirceu-ataca-Temer-e-pede-luta-por-elei%C3%A7%C3%B5es-j%C3%A1.htm