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sexta-feira, 21 de fevereiro de 2025

Sputnik Brasil: Brasil pode usar atalho do chinês DeepSeek para desenvolver inteligência artificial, diz analista


O aplicativo para smartphones DeepSeek em um celular em Pequim, China, em 28 de janeiro de 2025 - Sputnik Brasil, 1920, 21.02.2025


EUA e países aliados estudam medidas para restringir o acesso de seus cidadãos à inteligência artificial chinesa DeepSeek. Apesar de o desafio colocado pelo app chinês aos EUA ser tecnológico e comercial, Washington usará instrumentos ideológicos para combatê-lo, disseram analistas à Sputnik Brasil.
Nesta segunda-feira (17), a Coreia do Sul confirmou sua decisão de suspender o acesso ao aplicativo de inteligência artificial chinês DeepSeek. De acordo com o governo de Seul, o aplicativo foi removido das versões locais da App Store e Google Play.
Autoridades sul-coreanas alegam que o DeepSeek não atende aos requisitos de privacidade do país e reconhecem que o retorno do aplicativo chinês ao seu mercado "inevitavelmente tomará algum tempo", reportou a Al Jazeera.
Anteriormente, o Ministério do Comércio, Indústria e Energia da Coreia do Sul já havia banido seus funcionários de usar a tecnologia chinesa, citando preocupações de segurança e privacidade.
Espectadores assistem a noticiário sobre o bloqueio do aplicativo chinês DeepSeek, em Seul, Coreia do Sul, 17 de fevereiro de 2025 - Sputnik Brasil, 1920, 21.02.2025
Espectadores assistem a noticiário sobre o bloqueio do aplicativo chinês DeepSeek, em Seul, Coreia do Sul, 17 de fevereiro de 2025
Os EUA estudam implementar bloqueios federais ao uso do DeepSeek por agências governamentais. Em janeiro, a agência espacial NASA proibiu o uso do aplicativo pelos seus funcionários. A Marinha dos EUA alertou seus membros a não usar o aplicativo, dadas as "preocupações éticas e de segurança sobre a origem e uso dos modelos", reportou o Wall Street Journal.
Suspensões similares são esperadas em outros países com fortes laços com os EUA. Austrália e Taiwanbaniram o uso do DeepSeek for funcionários governamentais, enquanto a Itália quer restringir o acesso do app a dados pessoais de seus cidadãos.
Visitantes vestidos com trajes tradicionais posam para fotos na Cidade Proibida, em Pequim, 21 de fevereiro de 2025 - Sputnik Brasil, 1920, 21.02.2025
Visitantes vestidos com trajes tradicionais posam para fotos na Cidade Proibida, em Pequim, 21 de fevereiro de 2025
Para o doutor em ciência política pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e analista de relações internacionais Diego Pautasso, a resposta de países do Ocidente coletivo ao uso da tecnologia chinesa é de fundo comercial e ideológico.
 
"Podemos considerar o DeepSeek uma tecnologia disruptiva, já que ela utiliza menos investimento, menos hardware e chips alternativos que fogem ao bloqueio dos EUA", disse Pautasso à Sputnik Brasil. "Por ser aberto, o DeepSeek ainda gera um tombo no modelo de negócios das big techs norte-americanas."
 
O DeepSeek surpreendeu a indústria de alta tecnologia ao desenvolver modelo de inteligência artificial generativa com resultados análogos aos norte-americanos, utilizando uma fração de capital e capacidade computacional.
Visitantes tiram fotos ao longo do cênico Lago Oeste durante o crepúsculo em Hangzhou, cidade-sede da empresa chinesa de inteligência artificial DeepSeek, na província de Zhejiang, 2 de dezembro de 2024 - Sputnik Brasil, 1920, 21.02.2025
Visitantes tiram fotos ao longo do cênico Lago Oeste durante o crepúsculo em Hangzhou, cidade-sede da empresa chinesa de inteligência artificial DeepSeek, na província de Zhejiang, 2 de dezembro de 2024
"O DeepSeek é na verdade a ponta do iceberg do gigantesco programa de inteligência artificial da China, que faz parte do desenvolvimento de sua economia digital", declarou Pautasso. "As big techs norte-americanas, que exercem monopólio sobre a economia de dados e todas as suas aplicações econômicas, comerciais, financeiras e políticas, agora deverão enfrentar a concorrência da China."
O vice-presidente dos Estados Unidos, JD Vance, chega ao Grand Palais durante a Cúpula de Ação de Inteligência Artificial em Paris, 11 de fevereiro de 2025 - Sputnik Brasil, 1920, 11.02.2025
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Ameaça chinesa?

Em uma economia de mercado, a competição deveria ser celebrada como fonte de preços baixos e estímulo à inovação. No caso chinês, no entanto, o Ocidente mobiliza narrativas ideológicas para justificar a imposição de barreiras que dificultam o acesso ao DeepSeek.
 
"Essa questão da percepção do DeepSeek ou outras tecnologias chinesas como ameaça não é nada de novo e, obviamente, está baseado muito mais na construção de uma mentalidade de Guerra Fria do que na realidade", disse Pautasso.
 
A diretora do Curso de Relações Internacionais da PUC-Campinas, Kelly Ferreira, concorda, e diz que a narrativa antichinesa se consolida também no Brasil.
 
"Quando uma nova tecnologia norte-americana é anunciada, dificilmente os brasileiros encaram como uma potencial ameaça. Agora, se a tecnologia é chinesa, mesmo que o produto ofereça as mesmas facilidades, mesmo que ele contribua com o dia a dia do usuário, ele será recebido como uma ameaça" disse Ferreira à Sputnik Brasil. "Nesse sentido, podemos dizer que Hollywood fez o seu trabalho, porque já existe uma narrativa muito forte em relação a isso."
 
Aplicativos norte-americanos análogos ao DeepSeek têm acesso similar aos dados pessoais de seus usuários, e também se utilizam da interação com o internauta para treinar e aprimorar seus algoritmos. Enquanto o acesso a informações pessoais por aplicativos norte-americanos é considerado parte do modelo de negócios, no caso chinês é visto como uma fonte de controle social, argumentou Ferreira.
Um visitante passa por um estande de exposição exibindo educação escrita por inteligência artificial (IA) durante a Conferência Mundial de Inteligência Artificial (WAIC), Governando a IA para o Bem e para Todos, no Salão Multifuncional do Shanghai Expo Center em Xangai, China, 4 de julho de 2024 - Sputnik Brasil, 1920, 19.02.2025
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A dissonância é ainda mais notável se considerarmos que as únicas big techs que sabidamente interferiram em processos políticos em países terceiros são norte-americanas. Por exemplo, comunicações de altos funcionários da antiga rede social Twitter com o FBI e a CIA documentam o uso de contas falsas pelo governo dos EUA para influenciar o debate político no Oriente Médio.
"As únicas big techs que foram utilizadas amplamente para o domínio dos dados e para desestabilização de governos que se tem notícias são as big techs ocidentais. O resto são suposições", notou Pautasso.
O selo da Agência Central de Inteligência (CIA, na sigla em inglês) em sua sede, em Langley, Virgínia. EUA, 13 de abril de 2016 - Sputnik Brasil, 1920, 21.01.2023
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"Toda linguagem e todo algoritmo tem um viés. Não existe tecnologia neutra. E assim como o ChatGPT, o DeepSeek também tem seus padrões regulatórios e suas escolhas", considerou Pautasso. "Mas a China bate na tecla da autodeterminação, que cada país deve buscar seu próprio modelo de desenvolvimento. Não temos evidências de que a China vá usar o DeepSeek para promover mudanças de regime, guerra híbrida ou revoluções coloridas."
 
Segundo a professora Ferreira, a política externa chinesa não coloca como objetivo exportar a ideologia comunista ou o modelo político centrado em partido único. "Um olhar mais atento revela que a diplomacia chinesa é extremamente pragmática e focada sobretudo nos seus interesses econômicos e de segurança."

Brasil

O Brasil ainda não desenvolveu modelos próprios de inteligência artificial e segue atrás na corrida pela nova tecnologia. Por isso, poderá utilizar plataformas abertas como o DeepSeek para desenvolver soluções próprias, sugere Pautasso.
 
"O modelo do DeepSeek, que é aberto e barato, permite que países retardatários como o Brasil possam pegar atalhos e construir seus modelos de inteligência artificial local, adaptado ao padrão regulatório do nosso país", disse Pautasso. "As big techs norte-americanas não oferecem essa alternativa."
O Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação lançou um programa abrangente de desenvolvimento de inteligência artificial, atestando o interesse do governo federal no tema. No âmbito da diplomacia, a inteligência artificial foi citada pelo Itamaraty como tema prioritário para a presidência brasileira do BRICS em 2025.
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"De forma geral, a estratégia dos EUA para frear o uso de inteligência artificial chinesa provavelmente não dará certo. Já não deu certo com a internet 5G da Huawei. Já não deu certo em relação à restrição do uso de semicondutores pela China. Então, não tem por que dar certo com o DeepSeek", concluiu Pautasso.
 
Fonte: https://noticiabrasil.net.br/20250221/brasil-pode-usar-atalho-do-chines-deepseek-para-desenvolver-inteligencia-artificial-diz-analista-38614690.html
 

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