"Foi o que foi revelado no último dia 30 com o ofício do próprio presidente do Ibama sinalizando que não há recursos nenhum", disse Izabella Teixeira, ex-ministra do Meio Ambiente
Bolsonaro, floresta em chamas e Ibama (Foto: REUTERS/Adriano Machado | REUTERS/Ueslei Marcelino | Divulgação/IBAMA)
Rede Brasil Atual - O primeiro relatório elaborado pelo grupo de transição do governo eleito de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na área do Meio Ambiente mostra que a previsão orçamentária, indicada pelo atual governo de Jair Bolsonaro (PL) para 2023, torna impossível colocar em prática políticas de defesa do meio ambiente. Ao contrário, o retrato da gestão ambiental pública é “crítico” e comprova um processo “deliberadamente estruturado” nos últimos quatro anos do governo derrotado para “destruição e fragilização da área”.
É o que destaca a ex-ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, que integra o GT da Transição, em entrevista a Rafael Garcia na edição desta segunda-feira (5) do Jornal Brasil Atual. De acordo com a ex-ministra, o raio-x inicial da área revela que não há somente uma “erosão” de instituições como Ibama, o ICMBio e do próprio Ministério do Meio Ambiente. Como também uma “erosão” de políticas públicas que deveriam ser implementadas, por exemplo, na questão do combate ao desmatamento.
“Foi o que foi revelado no último dia 30 com o ofício do próprio presidente do Ibama sinalizando que não há recursos nenhum para o Ibama agir. Eu, em 35 anos de carreira, nunca vi um colapso orçamentário dessa natureza. Há uma falência da máquina pública e não creio, pelo que nós estamos ouvindo dos outros grupos, que seja um ‘privilégio’ da área ambiental. É na realidade um legado desse governo. Há uma falência da máquina pública federal, o que vai determinar uma complexidade política muito grande de reorganizar essa máquina em função dos objetivos do governo eleito de Lula”, comenta Izabella.
Sem cooperação do governo Bolsonaro
O grupo entra agora na segunda semana de trabalho com o desafio de consolidar os dados, levantar os programas que foram descontinuados e indicar as prioridades para os primeiros 100 dias da nova gestão. Esse processo deve ser concluído no próximo domingo (11), com um novo relatório que será entregue ao vice-presidente, Geraldo Alckmin (PSB). De acordo com a ex-ministra, há um subgrupo que está dedicado a identificar os retrocessos feitos por meio de decretos presidenciais e atos administrativos. A medida é necessária para que seja recomendado o chamado “revogaço”, que já é dado como certo pelos integrantes.
A equipe também segue ouvindo a sociedade civil. Apenas na semana passada, foram mais de 200 instituições que participaram desse processo de escuta. E, segundo Izabella, há um forte engajamento da sociedade em não apenas apontar déficits, como também indicar caminhos para a construção de novas políticas públicas. Por outro lado, a atual gestão bolsonarista tem apresentado apenas informações fragmentadas, que não permitem desenhar um quadro real do meio ambiente no Brasil.
Políticas interseccionais
Diante desse obstáculo, a saída tem sido a colaboração de servidores de outras áreas, como o Tribunal de Contas da União (TCU), conforme detalha a especialista. Outro desafio da equipe é não somente reorganizar, mas realinhar os objetivos ambientais para a contemporaneidade. “Mostrar como a máquina e as políticas públicas devem estar voltadas para o futuro e não somente para resgatar o que existia antes. Há um trabalho duplo de colocar de pé e olhar para o futuro, o que vai exigir muito da equipe que o governo Lula vai designar para cuidar das questões do Brasil”, afirma Izabella.
“Estamos trabalhando com a perspectiva estratégica de colocar diretrizes, programas, indicações, formar um time que possa olhar o Brasil no futuro a partir de hoje. Quer dizer, precisamos estar melhor no futuro. (…)O Brasil tem que ser objetivo e pragmático. Temos que entender o que tem ficar no passado, como o desmatamento, é igualzinho com a pobreza e o racismo. Temos que entender como essas questões se conectam para dar robustez às políticas públicas e evitar retrocessos no futuro”, propõe.
O grupo também antecipa que a nova política do governo eleito deverá ser no sentido de adequação da relação do “homem” com a natureza. Além disso, a equipe de transição já vem negociando o restabelecimento do Fundo Amazônia com recursos de outros países. Ainda na 27ª edição da Conferência do Clima da ONU, a COP27, Noruega e Alemanha sinalizaram ao futuro presidente a disposição de investir novamente no Brasil.
Retorno do investimento internacional
Segundo a ex-ministra, a parceria entre os países já deve ser retomada na primeira semana de janeiro. “Há claramente interesses robustos de uma perspectiva de novos investimentos internacionais, o que requer do Brasil uma visão. Esse é um assunto muito voltado para as questões climáticas. O clima hoje é uma agenda de desenvolvimento no mundo, com contornos muito mais amplos do que o chamado ambiente”, explica Izabella.
A especialista destaca ainda a aprovação da chamada PEC da Transição como fundamental para restabelecer o orçamento do meio ambiente. A Proposta de Emenda à Constituição 32 prevê, por exemplo, que doações internacionais não fiquem circunscritas ao Teto de Gastos, que limita investimentos sociais. “Isso é extremamente importante não só para área ambiental, educação e para as universidades, porque você está doando recursos, não são recursos que vêm do chamado orçamento público, são recursos que precisam estar no orçamento sem estar com restrição do teto fiscal”, observa a ex-ministra.
O debate sobre a PEC segue nesta semana no Senado, com a previsão dela ser votada nos próximos dias. A aprovação é vista como necessária para o que Brasil siga negociando os investimentos internacionais propostos por diversos países.
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