quarta-feira, 21 de dezembro de 2016
Governadores não querem morrer com Temer
A derrota vergonhosa do governo no projeto para renegociar dívidas dos
Estados -- o placar foi de 296 votos a 12 -- implica num sinal político para o
Planalto. Primeiros a pagar a conta de um projeto que só implicaria em novos
sacrifícios à população que já suporta uma recessão sem perspectiva, os
governadores de Estado mobilizaram as bancadas estaduais para dizer que não
querem morrer com Michel Temer.
Este é o recado da votação de ontem, último dia de trabalhos da Câmara em
2016. O resultado permitiu enxergar uma nítida linha divisória entre o Planalto
e o conjunto do país, com um agravante sério: implica numa derrota na área
econômica, até aqui vista como uma espécie de manto sagrado capaz de proteger
Temer e seu governo.
Enquanto o presidente quer submeter o Brasil a uma política de depressão
econômica, sintetizada pela confissão pública de quem "não teme medidas
impopulares", os parlamentares e governadores, que sempre deram uma maioria
folgada ao Planalto, agora deixaram claro que não querem afundar junto para
salvar Temer. Se em maio fizeram o favor de aprovar o impeachment sem prova de
crime de responsabilidade, em dezembro sinalizaram que até na esperteza e na
traição a princípios é preciso ter algum limite para garantir a sobrevivência --
até porque seu poder depende do voto.
Se Temer não tem planos para 2018, governadores, deputados e senadores
sabem que dentro de dois anos estarão perante suas bases para pedir seu voto e
agiram de acordo. Não querem ser vistos na foto da paisagem social terrível que
se forma em estados quebrados, a população furiosa e as autoridades
desmoralizadas.
Na versão original, elaborada pelo ministério da Fazenda de Henrique
Meirelles, Brasília até aceitava que os Estados em posição de calamidade
suspendessem o pagamento de suas dívidas pelo prazo de três anos, como Rio de
Janeiro, Rio Grande do Sul e Minas Gerais. Também abria, para outros estados, a
possibilidade de adiar pagamentos por 20 anos. Em qualquer caso, contudo,
cobrava-se um conjunto de contrapartidas a que podem ser divididas entre
inaceitáveis e marotas, pois sua maior consequência seria aprofundar a depressão
e o o sofrimento dos cidadãos.
A principal exigência de Meirelles-Temer era a criação de um programa de
privatização, cuja maior consequência seria a transformação de áreas inteiras
do serviço público em mercados a serem explorados por empresas particulares. Em
estados que sofrem uma pressão legítima dos cidadãos pela melhoria do serviço
público -- ainda mais em tempos de crise -- também se cobrava a proibição de
novas contratações e a realização de concursos para ingresso de pessoal. Em
medidas que têm consequências diretas sobre a qualidade do atendimento ao
público, previa-se a suspensão de reajustes nos salários, a criação de cargos
e, para lanhar ainda mais as costas do funcionalismo, um aumento na contribuição
previdenciária.
O resultado foi uma aula de democracia, este regime que possui inúmeros
defeitos, ainda mais no Brasil -- mas é aquele que oferece as melhores
oportunidades para os cidadãos dos patamares inferiores da pirâmide defender
seus direitos. Para cada voto a favor, o plenário entregou 24 votos
contrários.
Depois da magra vitória que permitiu a aprovação da PEC 55 pelo Senado --
apenas quatro votos acima do mínimo necessário -- o resultado de ontem marca um
novo sinal das dificuldades que começam a marcar o convívio do Planalto junto ao
Congresso. A legislação até permite que o presidente vete determinadas decisões,
desfigurando a decisão da Câmara. A goleada de 296 a 12 mostra que o próprio
Temer terá de fazer o serviço vergonhoso de contrariar uma imensa maioria -- e
pagar o desgaste por isso.
http://www.brasil247.com/pt/blog/paulomoreiraleite/271553/Governadores-n%C3%A3o-querem-morrer-com-Temer.htm
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