segunda-feira, 19 de dezembro de 2016
A atual fase do golpe e suas faces
Um golpe sempre produz gravíssimas rupturas de ordens institucional,
jurídica, econômica e social. E esse golpe tem um agravante: diferentemente da
ditadura civil-militar, quando os militares assumiram o controle, enquadrando as
demais instituições (para gerar alguma estabilidade, pela força), o que vemos
agora é uma luta fratricida entre os três poderes pelo controle do golpe.
As consequências das rupturas democráticas aparecem de variadas formas
(disputa entre poderes, instabilidade das instituições, experimentos de golpes
dentro do golpe...). Nas tentativas de contorna-las, os golpistas sempre abrem
novas frestas a indicarem que “remendos novos em panos velhos” só servem para
tamponar momentaneamente o caos.
Todos sabemos que o golpe no Brasil é patrocinado pelos Estados Unidos,
especificamente pela Wall Street (o rentismo financeiro internacional). Apesar
de as eleições americanas terem consagrado justamente a Main Street (o setor
produtivo), na figura de Donald Trump, o capital especulativo internacional,
concentrador de renda e riqueza, precisa manter nosso país como uma colônia
extrativista (haja vista nossos abundantes recursos naturais) e de mão-de-obra
precarizada. Ademais, para a geopolítica estadunidense, o Brasil não tem o
direito de dar voo solo em nenhuma hipótese.
Para conseguir golpear nossa democracia de baixa intensidade, os rentistas
internacionais optaram por patrocinarem um tipo de ruptura diferente. Ao invés
de invasão externa (impossível num país da nossa dimensão) ou na aliança com os
setores militares (metodologia utilizada na América Latina na segunda metade do
século passado), resolveram apostar em figuras autóctones para tocar a
empreitada.
Há características psicopatológicas comuns, perceptíveis nos principais
líderes golpistas brasileiros: desejo incontido de poder, prestígio e bajulação
e uma imensa fraqueza moral e ética, própria de personalidades pueris.
Investir nesse tipo de personalidade - de pessoas que não têm limites; vivem
num mundo paralelo; postam-se como cidadãos acima do bem e do mal e são
obcecados pelo poder a qualquer custo -, foi o tiro certeiro e bem orquestrado
para a implementação do golpe. No momento adequado, serão descartados do jogo.
Fundamentalmente, duas estratégias foram utilizadas para criar as condições
para o golpe: a primeira, treinar pessoas cuidadosamente escolhidas para
executarem milimetricamente o enredo golpista. E, depois, utilizar da grande
mídia para endeusar esses “salvadores da pátria”, distorcer fatos, eleger bodes
expiatórios, criar um clima de instabilidade, ódio e manipulação da realidade.
As principais faces autóctones do golpe são: no campo político, Aécio Neves e
Cunha (já descartado) e no campo jurídico, Gilmar Mendes, Janot, Moro e os
procuradores da Lava-jato. Vejam que essas personagens têm em comum as mesmas
características mencionadas acima: desejo incontido de poder, prestígio e
bajulação e uma imensa fraqueza moral e ética, própria de sujeitos pueris. As
cenas amistosas entre Aécio e Moro, recentemente, foram mais uma evidência da
trama golpista, entre tantas outras.
Temer, como já discutimos em outro post, é uma espécie de mamulengo.
Está, literalmente, nas mãos dos nominados acima e de outros de igual extirpe
aninhados no seu partido, o PMDB. Muito provavelmente continuará dançando
conforme a música tocada pelos verdadeiros líderes golpistas ou será solenemente
descartado quando sua “missão” tiver sido devidamente cumprida.
Na atual fase do golpe importa consolidar as condições para devolver o Brasil
à sua condição de colônia do capitalismo rentista. Portanto, aniquilar os
direitos sociais conquistados na Constituição Federal de 1988 (antiga PEC 55 e
as “reforma” da previdência e trabalhista). Para tanto, há uma orquestração das
ações nos campos político (poderes executivo e legislativo) e
jurídico-constitucional (STF).
Porém, devido a onda crescente de insatisfação popular (capturada nas
pesquisas de avaliação do governo) e a disputa figadal entre os três poderes
(cujo objetivo comum é a autopreservação de seus quadros, dado a evidente
corrupção sistêmica e estrutural que os domina), resta agora apelar para
estratégias de comunicação de massa com o objetivo de dissuadir uma revolta
popular. Registre-se que somente uma revolta poderá deter o golpe; afinal, o
enfraquecimento e as disputas entre os campos progressistas e de esquerda não
impõem qualquer perigo.
Para tentar contornar um possível caos social, uma avalanche de anúncios e
programas midiáticos otimistas estão em curso. O objetivo é contrapor o clima
policialesco que domina os noticiários – sempre à caça de culpados seletivamente
escolhidos - e tamponar o saque ao erário e a guerra entre os golpistas. O
encontro ocorrido entre o presidente e o dono da emissora oficial do golpe, a
Rede Globo, nesses dias, evidencia parte dessa estratégia.
Por outro lado, para aplacar a ira dos setores econômicos, que perceberam que
o golpe está aprofundando seus prejuízos, o governo anunciou um pacote de
bondades para as áreas financeira e empresarial e de maldades para os
trabalhadores.
Imaginem os lucros estratosféricos que serão auferidos pelos setores
farmacêutico, hospitalar, de seguros e de planos de saúde com o desmonte da
previdência e da saúde pública, por exemplo. Esses são alguns dos ganhadores do
golpe. Nem os militares tiveram tanta ousadia. O custo dessa aventura será
alto...
Acontece que, nas economias capitalistas, a somatória de golpe com recessão
econômica gera, inevitavelmente, além da incerteza, uma avalanche de temor, medo
difuso e “salve-se quem puder”. Preocupados com a sobrevivência, os
trabalhadores (parte mais fraca) se recolhem num primeiro momento. Por isso, o
esvaziamento das ruas. Mas a recessão impõe condições de vida tão precarizadas
que os grupos rancorosos, racistas, fascistas e movidos por medo e ódio, de
todos os segmentos sociais, aparecem, derivando numa situação sem controle, mais
cedo ou mais tarde. Já começamos a viver essa situação.
Enganam-se aqueles que pensam em futuro promissor nessas condições, ainda
mais num país onde a justiça sempre foi seletiva e desacreditada e as
instituições referenciais, como as igrejas, também são objeto de desconfiança
pública.
Ou o país retoma os rumos de uma democracia (o arranjo menos ruim), pelo voto
popular, ou cairemos numa situação de barbárie.
http://www.brasil247.com/pt/colunistas/robsonsavioreissouza/271149/A-atual-fase-do-golpe-e-suas-faces.htm
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