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15:14 01.06.2021(atualizado 15:50 01.06.2021) URL curta
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Brasil lidando com COVID-19 no início de junho de 2021 (4)
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A Sputnik Brasil conversou com Acácio Augusto, professor no Departamento de Relações Internacionais na UNIFESP, para entender melhor o papel político da mais recente manifestação contra o governo Bolsonaro.
Lideradas por organizações de esquerda, milhares de pessoas foram às ruas em protesto contra o presidente Jair Bolsonaro no sábado (29). As manifestações ocorreram em todas as capitais e no Distrito Federal.
Além de criticar as ações do governo federal durante a pandemia do novo coronavírus, os manifestantes pediram a aceleração da vacinação no Brasil e o impeachment do presidente. A grande maioria dos participantes usaram máscaras durante os protestos.
Para entender melhor o papel político dessa manifestação e suas implicações para o governo Bolsonaro e para a oposição, a Sputnik Brasil conversou com Acácio Augusto, professor no Departamento de Relações Internacionais na Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) e coordenador do Laboratório de Análise em Segurança Internacional e Tecnologias de Monitoramento (LASInTec).
© REUTERS / Ricardo Moraes
Manifestantes durante protesto contra o presidente Jair Bolsonaro, Rio de Janeiro, 29 de maio de 2021
Irritação com presidente
Augusto aponta três fatores que levaram as pessoas a participarem de protestos de rua em meio à pandemia.
O maior conhecimento do funcionamento do vírus SARS-CoV-2 seria o primeiro. "Já existe uma clareza de que em lugares abertos, usando uma máscara de qualidade, como a PFF2 ou N95, é possível correr menos riscos".
A segunda razão seria a grave situação política que o Brasil passa e a avaliação de que "o presidente é um risco maior do que o vírus". E, por fim, o terceiro fator seria a constatação de que a grande maioria das pessoas que vivem nas grandes cidades não estão isoladas.
Motoristas de aplicativo de entrega e funcionários de vários setores do comércio estão trabalhando desde o começo da pandemia e, quem não está trabalhando, está desempregado, ressalta o pesquisador.
"[As pessoas estão] vivendo o dilema: 'Bom, por que eu vou me preservar do vírus se eu não tenho nem como me manter?".
© Foto / Comunicação MST
Ato contra a fome e em defesa da vacina e do auxílio emergencial em meio à pandemia da COVID-19 realizado na última quarta-feira, 26 de maio de 2021, em Florianópolis, Santa Catarina
Grande adesão à manifestação
Augusto ressalta que, apesar de ter sido convocada por organizações de esquerda, como frente Povo sem Medo, frente Brasil Popular e a Coalizão Negra por Direitos, a manifestação "vazou".
"Não foi uma manifestação exclusivamente das frentes e dos movimentos de esquerda. Acho que isso ficou claro com uma série de manifestações individuais de pessoas lembrando algum familiar que tenha morrido de COVID-19", comenta o especialista.
E essa adesão mostra, para Augusto, que a manifestação não só foi grande como revela que teria o potencial de ser ainda maior. "Você acompanhava nas redes sociais que muita gente deixou de ir porque tinha uma comorbidade específica, porque tinha algum receio em relação a um familiar, mas que se não fosse isso estaria na rua", explica.
© REUTERS / PILAR OLIVARES
Ato em defesa da vacinação contra a COVID-19 no monumento do Cristo Redentor, símbolo do Rio de Janeiro, em 15 de maio de 2021
Mais protestos à vista?
O professor da UNIFESP não acredita que os movimentos de esquerda e as centrais sindicais vão convocar novas manifestações no curto prazo.
"Eu acho que nesse momento as centrais vão recuar de ir para a rua porque me parece que a avaliação é levar essa insatisfação até 2022 […]. Eu acho que as manifestações ainda respondem a uma lógica eleitoral e elas só vão estourar se elas vazarem isso. Como aconteceu no Chile e na Colômbia", afirma.
Augusto acredita que Lula e o Partido dos Trabalhadores (PT) provavelmente vão manter certa distância de possíveis novas manifestações, como fizeram no último sábado (29), uma vez que não haveria motivo político-eleitoral para apoiar as manifestações.
© AFP 2021 / Miguel Schincariol
Lula faz discurso no Sindicato dos Metalúrgicos em São Bernardo do Campo (SP).
"Se as manifestações derem certo, ele [Lula] vai inevitavelmente colher os frutos dela e, se houve algum tipo de crítica por conta da pandemia, ele não se comprometeu chamando", comenta.
Além disso, a avaliação de levar a polarização Lula-Bolsonaro para as eleições presidenciais de 2022 é "ao mesmo tempo uma avaliação cômoda, do ponto de vista do Lula e do PT, mas é também uma avaliação pragmática: a gente não tem como desenrolar um impeachment agora".
As forças de Bolsonaro
O coordenador do LASInTec afirma que o presidente da República conta com três apoios que são muito decisivos e impedem, por exemplo, a abertura de um processo de impeachment contra ele.
Embora volátil, o centrão, grupo parlamentar que se alinhou ao governo, impede que o processo de impeachment, caso fosse aberto pelo presidente da Câmara, Arthur Lira, fosse adiante para o Senado Federal.
Augusto destaca também que o presidente conta com uma base de apoiadores de 25% a 30% da população "que acredita em tudo em que ele fala". "E, mais preocupante, é o apoio que ele tem dentro de forças de segurança, o Exército e polícia", comenta.
O professor Acácio Augusto conclui fazendo um paralelo entre Bolsonaro e o primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orbán.
"Se ele [Bolsonaro] ganha [as eleições de 2022], ele faz aqui o que o Orbán fez na Hungria. Como foi com o Orbán? Ele fez um primeiro mandato que foi uma bagunça, com um monte de crises. Mas, quando ele conseguiu o segundo mandato, ele começou a desmontar tudo a favor dele. Bolsonaro agora em julho nomeia outra cadeira para o STF [com a aposentadoria do ministro Marco Aurélio Mello]. O projeto dele [Bolsonaro] é reconfigurar o Estado brasileiro, não necessariamente dando um golpe, porque não precisa. Esse é o risco dele".
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