Nada é mais urgente no Brasil do que uma genuína reforma política, que
assegure a mais ampla participação do povo nos destinos do país, a elevação de
sua consciência política, a irrestrita liberdade de organização, o combate ao
monopólio dos grandes partidos e à influência do poder econômico nas disputas
eleitorais. Uma reforma política democrática deveria assegurar igualdade de
condições competitivas entre as correntes progressistas, revolucionárias,
socialistas, comunistas, de um lado, e as conservadoras de outro, uma vez que o
sistema político e eleitoral vigente favorece apenas estas últimas. Por incrível
que pareça, os mecanismos de funcionamento das instituições políticas e de
organização das eleições do país, após mais de 30 anos da superação do regime
militar e quase o mesmo tempo de vigência da "Constituição cidadã", ainda
carregam as marcas do autoritarismo. Deblatera-se à farta sobre a aberração que
é o excessivo número de partidos, mas nada se diz do real monopólio do poder
exercido pelas siglas artificialmente majoritárias, representativas do
neoliberalismo e do conservadorismo, que usam as microlegendas fisiológicas de
direita como suas linhas auxiliares nas contendas eleitorais e no cotidiano da
vida parlamentar.
Uma reforma política democrática, para ser autêntica e eficaz e constituir um
passo à frente na elevação da capacidade de intervenção eleitoral e política das
forças de esquerda e do movimento democrático-popular é indissociável de uma
reforma do Judiciário, do Ministério Público, da Mídia. A rigor, é indispensável
uma ampla, profunda e progressista reforma do Estado brasileiro. Um dos
paradoxos da situação política nos últimos 13 anos foi representado pela
disjuntiva entre a existência de um governo progressista e a manutenção do
caráter reacionário do Estado nacional a serviço das classes dominantes. As
vulnerabilidades da esquerda e do movimento popular decorrem em grande medida do
fato de não se ter tomado qualquer iniciativa no sentido de alterar tal estado
de coisas. Se as forças progressistas não foram capazes de promover tal reforma
durante a vigência dos governos de Lula e Dilma, elas a farão agora, sob a égide
de um regime que é, na essência e na forma, de direita? Definitivamente, não. A
reforma política que interessa ao povo será fruto de uma ruptura. O caráter
dessa ruptura determinará os mecanismos para realizá-la – se uma Constituinte
para elaborar uma nova Carta, ou com escopo mais restrito.
Os partidos de esquerda e as organizações do movimento popular movem oposição
sistemática e inconciliável às políticas do governo Temer de ataque aos direitos
sociais. Assim também devem agir quanto à reforma política proposta pela trinca
PSDB-PMDB-DEM, com o aval dos presidentes das duas casas legislativas e do
governo Temer. Os partidos de esquerda não devem dar um voto sequer às
maquinações restritivas aos direitos democráticos do povo brasileiro constantes
da reforma política em tramitação.
O momento exige resistência e luta tenazes, com verticalidade, firmeza,
amplitude e coerência. Também flexibilidade, jamais cedência. O povo não
compreenderá se a esquerda se opõe ao regime nos seus projetos econômicos e de
liquidação dos direitos sociais e ao mesmo tempo aprova uma reforma política e
eleitoral feita precisamente para restringir direitos democráticos.
Igualmente, o momento exige plena unidade e solidariedade entre as forças de
esquerda. É inadmissível que se aceite a cláusula de barreira e a proibição das
coligações proporcionais e se "conceda" aos "pequenos partidos ideológicos" uma
"federação de partidos" artificial. Na situação em que se encontra, em plena
vigência de um regime reacionário e golpista, o PT – alvo preferencial de uma
brutal ofensiva e de perseguições que contêm a ameaça de o banir da vida
política, e em cuja defesa conta com a solidariedade incondicional dos
comunistas – não deveria permitir-se tamanha cedência à reforma política
proposta pela direita.
Esta reforma só merece a oposição enfática e uníssona de toda a esquerda.
http://www.brasil247.com/pt/colunistas/josereinaldocarvalho/261870/Esquerda-deve-dar-um-NÃO-enfático-e-uníssono-à-reforma-política-antidemocrática.htm
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